Então
querem o Serviço Militar Obrigatório! Nada contra, aliás, até ajudava a formar
muita gente. Mas vamos ver o que está no caminho.
NOTA:
Este texto é extremamente pequeno para o tema. Não toca em tópicos como a
vontade política individual de cada partido, da previsão futura de ameaças que
possam justificar o Serviço Militar Obrigatório e dos contextos Constitucionais
deste Serviço. Apenas me focarei em tópicos correntes e imediatos (dos quais
também são poucos, visto que cada um dos tópicos em que irei tocas daria para larguíssimos
textos), fazendo um julgamento da possibilidade a curto prazo ser reintroduzido
o Serviço Militar Obrigatório.
Comecemos pelos factores tangíveis para
formular uma Estratégia para reintegrar o Serviço Militar Obrigatório.
Primeiramente
temos o próprio Orçamento de Defesa. Com cerca de 1% do PIB alocado para o
sector da Defesa temos falta de dinheiro para pagar os vencimentos, subsídios e
reformas, sendo que todos os anos têm que haver reforços monetários para
colmatar as falhas.
Tudo
bem que o Governo já anunciou que ia meter mais dinheiro no Orçamento para a
Defesa, mas isto vem motivado por um Sr. Trump que pede os famosos 2% mais para
forçar uma mão política do que por um objectivo estratégico concreto e,
portanto, com a saída de Trump esta "obrigatoriedade" facilmente cai
e, o Orçamento da Defesa rapidamente volta para o 1%.
Ainda
acrescentando a este ponto, temos o Conceito Estratégico de Defesa Nacional 2013,
a Directiva 2020 e a Directiva Estratégica 2018-2021, nos quais a problemática
económica está bem presente, existindo em todos a forte vertente no corte de
despesas e de balançar as despesas com o pessoal.
De
seguida temos de olhar para a infraestrutura necessária para acomodar as
dezenas e dezenas de milhares de homens e mulheres.
Dentro
do Conceito Estratégico de Defesa Nacional 2013 e a Directiva 2020 temos uma
clara a posta na redução do dispositivo militar nacional, quer em termos de
efectivos (que deveriam ficar entre 32.000 e 30.000 efectivos nas Forças
Armadas) quer no numero de instalações disponíveis, ou seja, de 2013 a 2023
seria suposto manter os efectivos das Forças Armadas entre os 30 e os 32 mil, e
reduzir o numero de Quartéis no território nacional, negando assim a capacidade
para até simplesmente albergar a enchente de novos recrutas.
Existe
outro problema com a redução nos efectivos (que no momento está a baixo dos 30
mil), levando a que não existam militares de carreira suficientes para
administrar a instrução básica ou a instrução complementar (a chamada recruta),
pela falta actual de Cabos, Sargentos e Oficiais em numero e com experiência necessária
para acolher os recrutas no Serviço Militar Obrigatório, devendo estar sempre
em mente que estamos a falar de largas dezenas de milhares de jovens que
passariam a ingressar nas Forças Armadas.
Em
suma, não existem Quarteis e militares suficientes para suportar um Serviço
Militar Obrigatório do dia para a noite.
Existe ainda a falta de material militar para
o próprio treino e emprego dos novos militares. É sabido de todos os que
acompanham estes tópicos que, o drama da substituição da espingarda de assalto
HK G3 que actualmente equipa as nossas Forças Armadas.
Agora
púnhamos as coisas em perspectiva. Se para reequipar umas Forças Armadas que
não atingem os 30 mil efectivos, imagine-se a complicação e os problemas com os
concursos públicos para reequipar umas Forças Armadas que passem a empregar
várias dezenas de milhares de militares.
Antes
de passar aos factores intangíveis gostaria ainda de referir que os conceitos
estratégicos militares dos 3 Ramos em conjunto com o Conceito Estratégico de
Defesa Nacional 2013 e a Directiva Estratégica 2018-2021 estão focadas no
emprego de Forças Nacionais Destacadas pequenas, mas altamente treinadas, tal
como podemos ver com as forças de Paraquedistas e Comandos na República Centro
Africana.
Com
a enchente de milhares e milhares de novos efectivos não temos opções para o
seu emprego. O emprego teria assim de ser interno, quer na patrulha florestal,
quer no apoio de forças como a Autoridade de Protecção Civil ou o Corpo de
Bombeiros nacional, ou ainda em apoio às forças policiais (algo que tem vindo a
ser falado, problematizado e posto em papel nos últimos tempos).
Todos
estes novos efectivos não teriam no imediato um propósito Estratégico, algo extremamente
idiótico.
Passando
agora para alguns Factores intangíveis, podemos começar com a anemia social que
afronta o País.
A
anemia social e política aumenta e os números são muito alarmantes numa
Democracia. Isto é claro pelas últimas eleições Autárquicas onde houve uma
abstenção de c. 47%, pelas eleições Legislativas de 2013 onde a abstenção que
rondou c. 48% e sem falar das Legislativas de 2015, nas quais, a abstenção rondou
os 45% que, a preocupação pelos rumos do país não são a preocupação da
população, aliás, até nas últimas eleições presidenciais, aquelas que elegem o
supremo Comandante das forças Armadas, viram uma abstenção de c. 51%.
Do
ponto de vista Estratégico isto é grave, isto porque um dos valores a ter em
consideração no que toca ao cálculo de Poder é a «Vontade», ou seja, o desejo
de realmente ver um objectivo ou política alcançado.
Por
mais que exista dinheiro e uma ameaça que faça o país necessitar de um Serviço
Militar Obrigatório, se não existir o apoio da população a uma política que
siga neste sentido não ser, de maneira alguma, possível alcançar o objectivo.
Com
os números a demonstrarem que praticamente metade da população não se interessa
pelo processo politico e, assim, pelas suas consequências, não será viável a
implementação de uma obrigatoriedade que forçará a uma população jovem no
Ocidente ( e este Ocidente veja-se não como uma definição Geográfica, mas sim
com uma definição de um espaço largamente ocupado por Democracias onde a
informação e a capacidade de expressar opiniões é defendida e difundida) a
abdicar de simples liberdades diárias (como os cafés com os amigos, as idas ao
cinema, deixar de ter o telemóvel 24 horas ao seu lado, etc.) e forçar estes a
abraçar uma lógica de obediência a uma autoridade superior, castigos corporais
[nem que sejam simples flexões], uma estrutura hierárquica rígida, e o treino
para uma actividade que muitos possam ver como altamente deplorável, poderá ser
altamente controverso numa sociedade onde qualquer opinião é quase um desejo na
qual a sua concretização é um direito inaliável. O problema é se esse desejo é
o de não servir.
Desde
o fim do Serviço Militar Obrigatório já temos uma geração que não passou sequer
por pensar que poderia vir a servir nas Forças Armadas, uma geração que nunca
teve de pensar que teria que adiar a sua vida para ir assentar Praça sabe lá
onde. É uma geração que agora começa já a ter filhos e que não se identifica
com esta ideia e que agora poderá muito bem influenciar a próxima geração a
também não se identificar com o serviço militar, muito menos um que seja
obrigatório.
Sem
me querer alargar muito mais, acabo dizendo que o Serviço Militar Obrigatório,
se vier a ser reintroduzido, terá de ser um processo genético, ou seja, um
processo de vários anos, podendo mesmo ascender para lá dos 15/20 anos.
Sem
espaço físico, quadros suficientes, falta de material, dinheiro e vontade da
população não existe assim uma cultura de Defesa, e essa terá de voltar a ser
cultivada para que depois o Serviço Militar Obrigatório seja plenamente
implantado em Portugal.
Assim
sendo, e fechando em nota totalmente pessoal, apoiaria a reintrodução de um
Serviço Militar Obrigatório reformado à luz do que é a sociedade onde Portugal
se insere no Séc. XXI, esperando que este serviço possa ser alargado na sua
idade de ingresso, podendo dar assim mais uma oportunidade aqueles que apesar
de se terem dado como voluntários, não conseguiram entrar.
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