Siria e Iraque
Na passada quarta-feira, o
exército sírio, apoiado pelo poder aéreo russo, assumiu o
controle de Albu Kamal - a última base do Daesh na fronteira entre a Síria
e o Iraque. Na semana anterior, o exército
iraquiano tinha reconquistado
Al-Qaim. Al-Qaim era o último cruzamento fronteiriço entre o Iraque e a Síria dominado pelos terroristas
islâmicos, depois das forças iraquianas retomarem os cruzamentos de Al-Walid e
Rabia, respectivamente, localizados em Anbar e na província de Nínive. As
forças sírias e iraquianas encontraram-se na fronteira. O Daesh está derrotado.
No entanto pouca ou nenhuma
atenção foi dada a este momento absolutamente critico da luta contra o Daesh
pelos media tradicionais que ocupam o espaço publico noticioso do Mundo
Ocidental. Não me admira. Esta é uma vitória de Damasco, da Rússia, do Hezbollah,
do Irão, de Bagdad e não dos EUA, da casa de Saud e dos EAU.
Líbano
No passada sexta-feira dia 3 de
Novembro, vinte e quatro horas de pois de ter regressado ao Líbano, o primeiro
ministro Libanês, Saad Hariri, foi chamado de urgência a Riade. Com um discurso
particularmente estranho e cheio de invectivas ao Irão e ao Hezbollah, Hariri
renunciou em directo na Al Arabiya ao lugar de primeiro ministro libanês.
Segundo o seu discurso, a sua vida estava em perigo e o Hezbollah a qualquer momento
podia ser o seu executor, tal como já tinha acontecido com o seu pai,
assassinado pelo grupo xiita.
Um discurso paradoxal num local
estranho. Com uma agenda repleta para segunda-feira e uma governação que apesar
de tudo tem sido tranquila mesmo com a presença do Hezbollah, nada antecipava
esta cena digna de uma tragicomédia.
No entanto, as palavras que ele leu
- escritas para ele - estão inteiramente alinhadas com os discursos do príncipe
herdeiro Mohamed bin Salman (MbS) e com Trump e Tilerson que falam do Irão com
a mesma raiva, com que a bem pouco tempo brindavam Kim Jong-u.
As reacções não se fizeram esperar.
O líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, disse que a Arábia Saudita quase declarava uma guerra ao Líbano, fazendo uma "detenção" e colocando
em "prisão domiciliária" o primeiro-ministro libanês, Hariri, numa "intervenção
saudita sem precedentes" nos assuntos internos do Líbano.
Arábia Saudita (AS)
Todos achámos piada a entrevista
do robô Sophia na Websummit em Lisboa. Menos piada terão achado os onze príncipes,
quatro ministros e dezenas de altos funcionários actuais ou antigos, presos sob
ordens de um comité anti corrupção recentemente criado pelo príncipe herdeiro
Mohammed bin Salman (MbS), pois também eles tinham ido a Riyadh ver
a Sophia, a cidadã saudita ( ! ) num evento criado por MbS para atrair
investidores para a AS mas que se revelou ser um motivo ideal para reunir num
so local todos os que ele queria prender. Quem
tentou fugir por perceber o que iria acontecer morreu em situações estranhas.
No sábado 4 de Novembro, os
hóspedes do Ritz Carlton de Riyadh foram notificados que: "Devido à
reserva imprevista pelas autoridades locais, reserva esta que requeria um
elevado nível de segurança, não podemos acomodar os hóspedes ... até que a
normalidade seja restaurada”. Esta
iria ser a prisão de luxo para os seus familiares e governantes.
A purga, ordenada pelo príncipe
herdeiro de 32 anos, Mohammed bin Salman, estava em andamento. Em poucas horas,
as forças de segurança reuniram dezenas de membros da elite empresarial e
política da Arábia Saudita, principalmente na capital e na cidade costeira de
Jeddah.
Oficialmente ao lado de seu pai,
o Rei Salman, ele está executar o plano que transformará a Arabia Saudita num
moderno Estado. Para fazer isso
decidiu capturar a elite saudita, incluindo alguns membros da família real,
baseando a sua detenção em acusações de subornos e sobrefacturação de custo dos
projectos empresariais públicos.MbS acredita que, a menos que o
país mude, a economia vai se afundar numa crise que ameaça a família real e
enfraquece o país na sua rivalidade regional com o Irão. Para o rei Salman a purga foi em
resposta à "exploração por almas fracas que colocaram os seus próprios
interesses acima do interesse público, para, de maneira ilícita, acumularem dinheiro”. Entre os que estão presos no
hotel Ritz Carlton, está o príncipe Miteb bin Abdullah, que era o chefe da
poderosa Guarda Nacional e o primo do príncipe Mohammed. Foi também preso, o
príncipe Alwaleed
bin Talal, presidente da empresa de investimentos internacional Kingdom Holding,
e primo do príncipe Mohammed, e o príncipe Turki bin Abdullah, ex-governador da
província de Riyadh e um filho do falecido rei Abdullah.
Para os adeptos do Herdeiro – A
juventude do país, ansiosa por uma mudança social - o seu caminho pode ser o
de um ditador esclarecido, mas os seus motivos são justos e devem ser
defendidos. A purga representa uma abertura para a luta contra a corrupção,
para o islamismo moderado, o fim da segregação entre sexos e a liberalização da
vida social. Qual a razão para os sauditas terem simpatia pelos presos se todos
eles são uma horda de ricos corruptos, com esquemas criminosos envolvendo
suborno e lavagem de dinheiro?
MbS sabe que no futuro as pessoas
serão o seu elemento de criação de valor e não podem continuar a ser um fardo
de dependentes de apoios e subsidiação do governo saudita.
O
governo da Arábia Saudita precisa de cash e esta purga permiti-lhe também
isso. Com uma economia em mau estado, com os preços do petróleo estagnados e
com um futuro incerto ao nível das reservas e das tendências do mercado de
energia, o pior que podia acontecer aos sunitas da casa de Saud era os Xiitas
ganharem predominância no Médio-Oriente. Para isso bastaria que a Síria não
mudasse de regime, que o Daesh fosse derrotado, que o Qatar
ganhasse a confiança do Irão e da Rússia devido as suas reservas de gás e
que o Irão fosse gradualmente tomando conta da região. Para mal do reino são tudo
coisas que estão efectivamente a acontecer!
Esta purga dificilmente pode
resolver rapidamente as questões externas e internas, A liderança do reino
precisa desesperadamente de um inimigo para unir a população e distrair a
atenção dos eventos disruptivos que se desenrolam na Arabia Saudita e que
garantidamente vão continuar. A retórica bélica contra o Irão, o Líbano e o
Hezbollah são o sinal claro disso.
Enquanto o Irão é um actor
regional poderoso em termos militares e diplomáticos, o Hezbollah é um ator não
estatal que vem crescendo de influência na região. Para Riyadh estes são o
grupo inimigo, o alvo a apontar.
Arábia Saudita e Israel são
aliados óbvios na sua vontade de destruir o Hezbollah. Em 5 de Novembro, Tel
Aviv iniciou o maior exercício aéreo da história de Israel. Os sauditas e os
israelitas estão coordenando seus esforços contra o Irão e o Hezbollah,
escalando a situação já tensa no Oriente Médio.
Mas sobre isto escreverei no próximo
post onde para além de Israel abordarei o papel de Trump e Putin neste novo
cenário.