segunda-feira, 6 de novembro de 2017

O Problema da atrasada resolução do problema da Coreia do Norte.

Este texto sai como uma reflexão pessoal, baseio-me no conhecimento geral do tema sem pretender assumir como clara aposição de qualquer um dos actores, mas pretendendo apenas levantar algumas dúvidas que possuo sobre o assunto da Coreia do Norte.
Nos últimos tempos a Coreia do Norte e o seu programa Nuclear têm sido a batata quente das relações internacionais no palco do Oriente/Pacifico.
O programa Nuclear, e a aquisição de capacidades de detonação/emprego de armamento Nuclear pelo regime da Coreia do Norte parece-me que, de um só golpe, veio destruir a possibilidade de continuar o rumo tomado nos últimos 20 anos.
Os EUA a par da China, Japão, Coreia do Sul e Rússia tinham, mesmo que fosse 'off- the record' um entendimento, ou pelos menos, um "percebimento" de como manter a Coreia do Norte em Check.
A China, como o maior parceiro comercial da Coreia do Norte, baseia a sua balança de poder com a Coreia do Norte através da balança comercial. É do conhecimento geral que, depois da queda da URSS e da incapacidade da Federação Russa manter actividades de apoio fora do seu país a Estados "amigos" depois de 1991 levou a uma grave fome na Coreia do Norte, como tal, a capacidade de fazer dinheiro da Coreia do Norte é alimentada em muito pelo comércio que faz com a China. Esta China, é a China que nunca demonstrou demais hostilidades para com a Coreia do Norte, aliás, até ao actual líder subir ao poder, as visitas de altos dignitários e mesmo do Presidente da China à Coreia do Norte eram provas das relações cordiais entre os dois, e demonstrante do alicerce que a China representa para a Coreia do Norte, o contrário parece ser o que se pode ver com o actual líder, quanto a isto só o futuro pode dar respostas, mas parece-me que as relações irão azedar (não muito, mas que vão, vão).
O problema é que a China já não é o bicho papão Comunista dos anos 90 do século passado, os EUA, depois da guerra do Vietnam assumiram uma posição de isolação, de retracção do apoio directo e em força a movimentos que poderiam combater a URSS no contexto da guerra fria. A Guerra do Vietnam dividiu enormemente a sociedade americana e forçou o Congresso americano a fiscalizar e cortar em muito a força das acções do Presidente dos EUA em conflitos exteriores, daí os EUA terem permitido o emprego de forças Cubanas em Angola, com o apoio da URSS, de terem tido um papel mais pequeno que países do Médio Oriente na oposição à invasão da URSS ao Afeganistão, entre outros.
Este afastamento directo e monetário foi no entanto, e muito bem, colmatado com uma aproximação económica à China. Desde o final dos anos 70 até à Crise de 2008 a China, com apoio de empresas americanas que para lá se mudaram, conseguiu realizar uma enorme industrialização, criando um estado com dois sistemas e o colosso económico que existe hoje em dia, poderá dizer-se que, a economia americana decidiu entrelaçar-se com o seu adversário principal.
Com a China a tornar-se num país que passa de ser um Estado que defende a sua posição no pódio do Sistema Internacional através das suas Forças Armadas, e da ameaça do uso da força, a passar a ser um país que defende essa mesma posição através do seu poder económico, a existência de um país como a Coreia do Norte mesmo ao seu lado só pode prejudicar a China, especialmente como sendo um dos seus pilares, criando algum embaraço para a China, a China que parece agora mais Ocidental (na sua maneira de olhar para o Sistema Internacional [mas nunca se deve esquecer que o Estado chinês nunca se esquece dos “Tratados Desiguais” e do insulto que esses tratados representaram para a China no Século passado, não querendo a China voltar a ser insultada pelo Ocidente]).
Portanto a China mudou. E os EUA?
Os EUA a par do Japão e da Coreia do Sul tinham, no emprego de enormes números de homens, meios e superioridade tecnológica a sua dissuasão de uma acção Norte Coreana.
Mais uma vez a guerra do Vietnam demonstra ser a chave. No final da guerra os EUA empregavam cada vez mais meios e equipamentos inteligentes do que enormes números de homens para cumprir certas missões, mísseis conduzidos, computadores e sistemas de comunicação avançados demonstraram ser a aposta americana, e como já dito, com a retracção americana no que toca a meios convencionais depois da guerra do Vietnam (devido à pressão do Congresso e do povo americano), os EUA, para contrariarem a clara aposta da URSS em se expandir aproveitando esta retracção americana, decidem, e na minha opinião muito bem, responder com a aposta em modernizar e criar sistemas de armas e comunicações cada vez mais inteligentes que, de modo directo ou indirecto pudessem colmatar a insuficiência em meios tradicionais que era clara entre as forças NATO e do Pacto de Varsóvia (nomeadamente em meios mecanizados), a evolução do conceito dos helicópteros de combate, dos sistemas de radares, dos sistemas de misseis, sistemas de comunicações e disrupções destas foram as principais apostas americanas.
Os efeitos positivos desta aposta foram demonstrados várias vezes, como na guerra do Yom Kippur, na qual Israel mais uma vez se via cercada por ofensivas em todas as frentes, e através da disrupção dos radares, comunicações inimigas e a utilização de um escudo anti-ar à base de misseis aliada uma lógica de guerra fluída consistindo em várias unidades independentes que gerariam das segundas e terceiras linhas contra ataques altamente coordenados por capacidades de comunicação superiores, demonstrou ser a chave para Israel, estes equipamentos e a Doutrina de combate haviam sido importadas dos EUA, inicialmente desenvolvidas por este no Vietnam.
Esta mesma lógica de colmatar a superioridade numérica inimiga com superioridade táctica e tecnológica (que havia ganho a guerra fria para o Ocidente), é a mesma que é utilizada contra a Coreia do Norte na Coligação entre os EUA, Japão e Coreia do Norte, para além de toda a teoria, são imensos os vídeos de exercícios na Coeria do Sul da utilização destas lógicas como show de força contra a Coreia do Norte.
O problema é que o elevado poderio militar americano e aliado na área serviu de modelo desde os anos 90 (mesmo já com a China). Um numero menor de homens (se bem que ainda bem elevado) aliados a uma capacidade bélica que em termos tecnológico e doutrinais está anos luz à frente da Coreia do Norte serviu até agora para manter a Coreia do Norte no papel do cão mau sem dentes, no entanto, a capacidade Nuclear altera tudo isto.
O facto que da Coreia do Norte saber que quer a nível de uma massiva resposta das forças aliadas no Teatro do Pacífico quer a uma resposta ao nível Nuclear contra uma ofensiva sua desenhavam uma futuro trágico para si, mantinha a Coreia do Norte como um perigo apenas de propaganda (claro que para a Coreia do sul e mais recentemente para a China um conflito de qualquer espécie com a Coeria do Norte representava baixas e um forte crise de refugiados, com a qual, nenhum dos países quer lidar).
No entanto, na minha opinião, a capacidade Nuclear da Coreia do Norte oferece a esta a capacidade de anular o balanço/equilíbrio de poderes e dissuasão na região.
O facto da Coreia do Norte ter capacidade de atingir os EUA, China, Japão, Rússia e Coreia do Sul com armamento Nuclear e causar centenas de milhares e mesmo milhões de mortos obriga a que este regime seja tratado de outra maneira.
Em quanto existia uma espécie de um Status Quo muito estranho, agora, existe a muito real hipótese de que a resolução do problema da Coreia do Norte envolva confronto Nuclear, ora vejamos.
Uma entrada na Coreia do Norte, antes das capacidades nucleares, envolveria baixas militares e civis, talvez (todas juntas) em algumas centenas de milhar, mas restringiam-se à península Coreana, gerando vagas de refugiados para a China e Coreia do Sul mas, através das capacidades acima referidas, e como foi a Guerra do Golfo a prova, a guerra seria (muito provavelmente) muito curta, e isto se a solução fosse única e exclusivamente militar.
Agora vamos inserir o factor nuclear, o avanço das forças aliadas sobre a Coreia do Norte iria despoletar o lançamento de misseis nucleares que afectariam (caso fossem bem sucedidos) milhões de pessoas e a estabilidade da região, isto através de uma crise humanitária nunca antes vista, através do resultado da contaminação posterior por elementos radioactivos, etc.
Isto parece-me que teria uma reacção similar (mas muito mais forte) no povo e Congresso americano à reacção que houve contra o Vietnam, resultando numa retracção geral americana do palco internacional, similarmente ao que aconteceu pós final da Guerra fria (lembrem-se que nem com a tomada de Saigão pelo Vietnam do Norte os EUA se pronunciaram), permitindo uma nova expansão da Rússia e China, e de outros países, sem falar na proliferação e aumento de intensidade dos conflitos regionais e dos grupos terroristas que aproveitariam também esta retracção americana para aumentar a sua acção, e como acho que é claro a Europa não tem as capacidades e mind set correctos para contrariar estas acções (que agora seria redobradas).
A acção contra a Coreia do Norte será o espinho do Sr. Trump e de qualquer Presidente americano. A China e países envolventes não querem um conflito directo, como já demonstrado. Os EUA poderiam sair vitoriosos, mas com custos para a sua política global demasiado elevados, impossibilitando os EUA de prosseguir qualquer acto global no after conflito.
A solução, a meu ver, deverá passar por um estrangulamento lento da Coreia do Norte, e neste caso a China será essencial, como já referido, a China continua a ser uma pilar fortíssimo da Coreia do Norte, mas a mudança do paradigma e da China poderá permitir (se os EUA souberem aproveitar isso) que esta estrangule muito lentamente a Coreia do Norte, a um ponto tal que o próprio Estado caia por si próprio, ou mesmo por revolução interna (talvez um 25 de Abril na Coreia do Norte) fomentada e alimentada pelos aliados no Pacífico. Desde que impeça uma guerra quente.
A minha opinião.


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