Nesta exposição (feita em duas partes, do qual esta é a primeira) pretendo demonstrar como a maquina militar americana é o principal apoio da política externa americana, e de como esta política impõe indirectamente a direcção da evolução doutrinal e material da maquina de guerra americana.
A Segunda Guerra Mundial define os
EUA como uma potência mundial e, daí para a frente, como definidor de padrões
de acção.
No final da Segunda Guerra Mundial
os EUA mostram-se capazes de passar de um Estado não intervencionista (que
parecia por momentos voltar à política de Monroe de 1823 de não intervir fora
dos espaço de influencia directa dos EUA), para uma potência com uma projecção
global e com algo a dizer na direcção dos destinos do mundo fora do eixo
soviético.
Outra capacidade que revela é a da
rápida adaptação a uma forma de fazer a guerra que rompe com os conceitos
anteriormente tidos como inabaláveis. Após a Primeira Guerra Mundial e desde
cedo que existem, principalmente em Inglaterra, apologistas de uma Doutrina
militar focada em grupos de tanques e numa guerra relâmpago, que erroneamente é
atribuída como brainchild da Wermacht. Estes teóricos são postos de
parte.
As tácticas e manobras da guerra
mecanizada é abraçada na sua totalidade pelos alemães, levando que às rápidas
vitórias sobre a Polónia e a França nos primeiros anos da guerra. Diga-se ainda
que a França possuía mais, e melhores carros de combate que os alemães, no entanto,
a franca (ou quase inexistente) doutrina aplicada para o seu uso levou a uma
rápida e esmagadora derrota militar (o então Coronel Charles De Goulle foi o
único que ainda conseguiu contra atacar eficazmente as forças Panzer alemãs, mas sozinha de nada
podia).
Os EUA aprenderam rapidamente que,
sem abraçarem este noto tipo de guerra fluída seriam com quase toda a certeza
aniquilados em combate.
Para responder a isto os EUA decidem
aprender a bem o que os seus aliados aprenderam a mal, abraçando a guerra de
blindados, de manobra, comunicação e conjugação de meios e vectores. Aliando a
isto um enorme esforço na Home Front
que leva a que os EUA consigam produzir o suficiente para se sobrepor em número
ao seu inimigo.
Desta mudança sai a potência que até
hoje mais influência possui no globo, mas a sua influência actual sofreu
mudanças estas definidas pelas suas falhas e conquistas militares, físicas e
mentais.
Como já referido os EUA conseguiram
aprender e adaptar-se ao tipo de conflito da Segunda Guerra Mundial, o problema
agora seria que, a URSS e sua inimiga (num futuro muito próximo) também teria
aprendido com os seus erros e teria levado a cabo uma mudança similar à dos
EUA, o problema reside no facto de que a URSS conseguir ter um out put em termos de material e homens
muito maior que o dos EUA.
A Doutrina militar dos EUA definia
que, em caso de conflito com a URSS (diga-se um conflito convencional), as
capacidades das forças aliadas aos EUA e que mais tarde formariam a NATO, não
seriam suficientes para impedir um rápido varrimento da Alemanha Oeste e de
França, sendo apenas possível parar o avanço soviético no pireneus no Norte de
Espanha devido às condições geográfica que impediriam as forças blindadas da
URSS de progredir.
A partir deste ponto a Península
Ibérica serviria de Staging Area para
um contra ataque serviria para empurrar as forças Soviéticas o mais para trás
possível, e se necessário ameaçar (ou mesmo usar) armamento nuclear (com base
em bombardeiros de longo alcance para chegar ao território da URSS) para
submeter a URSS. Pelo menos era esta a ideia para contra balançar a
incapacidade das forças NATO e dos EUA de contra por a capacidade de produção
de forças blindadas da URSS.
A ideia base da Doutrina militar
americana (que por usa vez guiava a sua política externa [sendo que as guide lines da Estratégia definem que é
a política que define a acção do ramo militar]) era a de intervencionismo
imediato e directo sobre os conflitos, e isso levou a uma intervenção rápida,
forte e preponderante dos EUA na Coreia nos anos 50, essa mesma ideia levaria a
que no início dos anos 60 os EUA entrassem no Vietnam, já depois de terem
enviado inúmeros advisors (civis e
militares), para além de enormes quantias de dinheiro.
É no Teatro de Operações do Vietnam
que tudo se altera.
A intervenção de uma força americana
que chegou a passar o meio milhão de homens no terreno, e que possuía um
emprego massivo de poder de fogo marítimo, terrestre e aéreo.
Para além de enormes forças e
dinheiro, os EUA levam consigo a sua doutrina militar. A ideia de que uma
guerra é ganha com a captura de território e com a destruição das linhas de
abastecimento e comunicação inimigas, exaurindo a sua capacidade de combate.
No Vietnam, como todos sabemos, o
inimigo combate de uma forma completamente diferente, para além de que, a força
política desde o inicio impõe barreiras políticas às forças americanas, por
exemplo a impossibilidade de avançar para o Vietnam do Norte (com forças
terrestres) e de passar para o Camboja, mesmo em perseguição das forças
inimigas, se bem que esta ultima será, no final do conflito ignorada (por
permissão política) por um curto período de tempo.
Estas deficiências levam a que as
forças dos EUA não consigam lidar efectivamente com as forças do Vietnam do
Norte e com os Vietcong.
No entanto a Doutrina militar
americana acaba por mudar, deixa-se de basear as forças em quadriculas que
possuem forças de tamanho de Divisão ou similares, actuando em massa sobre uma
posição inimiga, procurando a batalha decisiva, mudando a Doutrina para uma de
actuação ao nível de Batalhões que actuam com base em informações do terreno e
que saem para caçar o inimigo, sendo auxiliados pelos famosos helicópteros UH-1 Iroquois que serviriam para
transportar homens, munições, medicamentos, comida e Água de e para o campo de
combate.
Aliado a isto os EUA perceberam que
precisariam de uma forte e eficaz rede de informações que lhes permitisse com
alguma certeza identificar o inimigo e a sua posição para que pudessem sem aerotransportadas
forças terrestres para combater as forças inimigas.
O modelo da Segunda Guerra Mundial e
da Coreia morre no Vietnam, em vez de milhas ganhas, a vitória mede-se em
corpos do inimigo, os EUA percebem que as guerras de guerrilha necessitam de uma
elasticidade muito maior e de uma capacidade tecnológica muito maior, algo que
os Portugueses em África também perceberem, chegando os EUA a levar para as
suas escolas de guerra os livros de combate em guerra subversiva para serem
estudados pelos oficiais americanos que estão ou irão actuar no Vietnam.
É no Vietnam que se iniciam lógicas
como OODA (Observe, Orient, Decide and Act) que seria a ideia de que sobre
qualquer acção inimigo dever-se-ia observar a acção inimiga e perceber o
porquê, orientar uma lógica de contrariar a vontade indicar, decidir o curso de
acção e agir em conformidade, repetindo-se este loop para qualquer acção inimiga, tendo em mente que cada acção era
única e que portanto mereceria uma observação, orientação e decisão adequadas,
e também a ideia do ALB (Air, Land, Battle), esta ultima só no inicio dos anos
80 é que viria a ser oficialmente lançada.
A nova ideia que surge da Guerra do
Vietnam. Esta guerra, denominada guerra de insurreição obriga a uma mudança de
Doutrina militar americana obrigando também a uma evolução teológica.
Apesar disto, e apesar de terem quer
ser dados os devidos louros aos cérebros militares, é no entanto, na sociedade
civil que está a génese do que viria a ser, o que se poderá chamar a título
comparativo, de uma política Monroe do Séc. XX.
A Guerra do Vietnam e o início da
participação activa dos EUA no conflito (quer dizer-se com isto uma participação
que vai para além da mera presença de observadores e instrutores americanos no
meio das fileiras do Vietnam do Sul) tem, inicialmente, uma boa aprovação do
povo americano, em muito devido à propaganda e clima social anti comunista dos
EUA que se vinha a gerar desde 1945.
Apesar dos povo americano não saber
onde fica o Vietnam e de não querer saber, o medo do monstro comunista é o suficiente
para que os ratings mostrem a aprovação de uma intervenção militar directa dos
EUA, acreditando que, a única coisa necessária para salvar o Vietnam do Sul
será a superioridade brutesca dos EUA.
Ao contrário do povo português, o
povo americano, ao longo da guerra, obteve imagens de repórteres que de parte
estatal quer de parte privada, mostrando todos os aspectos da guerra.
O governo americano viria a ser alvo
de enormes críticas do seu povo devido às imagens que chegavam dos Teatros de
Operações. Esta era a primeira vez que o povo americano tinha acesso, em larga
escala, às imagens da guerra, estas que iniciam uma mudança na opinião pública.
A situação americana começa a deteriorar
quando a guerra insurreccional que os EUA estão a combater não é ‘despachada’
com a rapidez que se pensava, a guerra arrasta-se e a sua aceitação começa a
cair.
As imagens dos mortos, e os números
de baixas sem sinal de vitória à vista (especialmente depois da ofensiva de Tet)
desmoralizam o povo americano, aliando isto à conscrição obrigatória, a guerra
do Vietnam cai na aprovação americana.
O final da guerra vê uma derrota dos
EUA (tendo em conta o seu objectivo de impedir o Vietnam do Norte de tomar o
Sul), mas não vê uma derrota militar da máquina americana, levando a que esta
sofra com a derrota política.
O Congresso americano impede fortemente
uma acção americana depois do cenário do Vietnam. Os homens e mulheres do
congresso dependem de eleições para aguentarem as suas posições, e num país em
que a maioria da opinião pública está contra a guerra, a oposição a uma nova intervenção
militar americana será um discurso bem recebido pelos eleitores americanos.
Apesar
disto os EUA continuam a ser os líderes de uma das facções de um mundo bipolar.
Esta posição tem de ser guarnecida.
O afastamento de uma doutrina que promove uma acção directa será tratada num post posterior.
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