segunda-feira, 6 de agosto de 2018

O Serviço Militar Obrigatório. Uma pequeníssima reflexão a curto prazo.


Então querem o Serviço Militar Obrigatório! Nada contra, aliás, até ajudava a formar muita gente. Mas vamos ver o que está no caminho.
NOTA: Este texto é extremamente pequeno para o tema. Não toca em tópicos como a vontade política individual de cada partido, da previsão futura de ameaças que possam justificar o Serviço Militar Obrigatório e dos contextos Constitucionais deste Serviço. Apenas me focarei em tópicos correntes e imediatos (dos quais também são poucos, visto que cada um dos tópicos em que irei tocas daria para larguíssimos textos), fazendo um julgamento da possibilidade a curto prazo ser reintroduzido o Serviço Militar Obrigatório.
            Comecemos pelos factores tangíveis para formular uma Estratégia para reintegrar o Serviço Militar Obrigatório.
Primeiramente temos o próprio Orçamento de Defesa. Com cerca de 1% do PIB alocado para o sector da Defesa temos falta de dinheiro para pagar os vencimentos, subsídios e reformas, sendo que todos os anos têm que haver reforços monetários para colmatar as falhas.
Tudo bem que o Governo já anunciou que ia meter mais dinheiro no Orçamento para a Defesa, mas isto vem motivado por um Sr. Trump que pede os famosos 2% mais para forçar uma mão política do que por um objectivo estratégico concreto e, portanto, com a saída de Trump esta "obrigatoriedade" facilmente cai e, o Orçamento da Defesa rapidamente volta para o 1%.
Ainda acrescentando a este ponto, temos o Conceito Estratégico de Defesa Nacional 2013, a Directiva 2020 e a Directiva Estratégica 2018-2021, nos quais a problemática económica está bem presente, existindo em todos a forte vertente no corte de despesas e de balançar as despesas com o pessoal.
De seguida temos de olhar para a infraestrutura necessária para acomodar as dezenas e dezenas de milhares de homens e mulheres.
Dentro do Conceito Estratégico de Defesa Nacional 2013 e a Directiva 2020 temos uma clara a posta na redução do dispositivo militar nacional, quer em termos de efectivos (que deveriam ficar entre 32.000 e 30.000 efectivos nas Forças Armadas) quer no numero de instalações disponíveis, ou seja, de 2013 a 2023 seria suposto manter os efectivos das Forças Armadas entre os 30 e os 32 mil, e reduzir o numero de Quartéis no território nacional, negando assim a capacidade para até simplesmente albergar a enchente de novos recrutas.
Existe outro problema com a redução nos efectivos (que no momento está a baixo dos 30 mil), levando a que não existam militares de carreira suficientes para administrar a instrução básica ou a instrução complementar (a chamada recruta), pela falta actual de Cabos, Sargentos e Oficiais em numero e com experiência necessária para acolher os recrutas no Serviço Militar Obrigatório, devendo estar sempre em mente que estamos a falar de largas dezenas de milhares de jovens que passariam a ingressar nas Forças Armadas.
Em suma, não existem Quarteis e militares suficientes para suportar um Serviço Militar Obrigatório do dia para a noite.
 Existe ainda a falta de material militar para o próprio treino e emprego dos novos militares. É sabido de todos os que acompanham estes tópicos que, o drama da substituição da espingarda de assalto HK G3 que actualmente equipa as nossas Forças Armadas.
Agora púnhamos as coisas em perspectiva. Se para reequipar umas Forças Armadas que não atingem os 30 mil efectivos, imagine-se a complicação e os problemas com os concursos públicos para reequipar umas Forças Armadas que passem a empregar várias dezenas de milhares de militares.
Antes de passar aos factores intangíveis gostaria ainda de referir que os conceitos estratégicos militares dos 3 Ramos em conjunto com o Conceito Estratégico de Defesa Nacional 2013 e a Directiva Estratégica 2018-2021 estão focadas no emprego de Forças Nacionais Destacadas pequenas, mas altamente treinadas, tal como podemos ver com as forças de Paraquedistas e Comandos na República Centro Africana.
Com a enchente de milhares e milhares de novos efectivos não temos opções para o seu emprego. O emprego teria assim de ser interno, quer na patrulha florestal, quer no apoio de forças como a Autoridade de Protecção Civil ou o Corpo de Bombeiros nacional, ou ainda em apoio às forças policiais (algo que tem vindo a ser falado, problematizado e posto em papel nos últimos tempos).
Todos estes novos efectivos não teriam no imediato um propósito Estratégico, algo extremamente idiótico.
Passando agora para alguns Factores intangíveis, podemos começar com a anemia social que afronta o País.
A anemia social e política aumenta e os números são muito alarmantes numa Democracia. Isto é claro pelas últimas eleições Autárquicas onde houve uma abstenção de c. 47%, pelas eleições Legislativas de 2013 onde a abstenção que rondou c. 48% e sem falar das Legislativas de 2015, nas quais, a abstenção rondou os 45% que, a preocupação pelos rumos do país não são a preocupação da população, aliás, até nas últimas eleições presidenciais, aquelas que elegem o supremo Comandante das forças Armadas, viram uma abstenção de c. 51%.
Do ponto de vista Estratégico isto é grave, isto porque um dos valores a ter em consideração no que toca ao cálculo de Poder é a «Vontade», ou seja, o desejo de realmente ver um objectivo ou política alcançado.
Por mais que exista dinheiro e uma ameaça que faça o país necessitar de um Serviço Militar Obrigatório, se não existir o apoio da população a uma política que siga neste sentido não ser, de maneira alguma, possível alcançar o objectivo.
Com os números a demonstrarem que praticamente metade da população não se interessa pelo processo politico e, assim, pelas suas consequências, não será viável a implementação de uma obrigatoriedade que forçará a uma população jovem no Ocidente ( e este Ocidente veja-se não como uma definição Geográfica, mas sim com uma definição de um espaço largamente ocupado por Democracias onde a informação e a capacidade de expressar opiniões é defendida e difundida) a abdicar de simples liberdades diárias (como os cafés com os amigos, as idas ao cinema, deixar de ter o telemóvel 24 horas ao seu lado, etc.) e forçar estes a abraçar uma lógica de obediência a uma autoridade superior, castigos corporais [nem que sejam simples flexões], uma estrutura hierárquica rígida, e o treino para uma actividade que muitos possam ver como altamente deplorável, poderá ser altamente controverso numa sociedade onde qualquer opinião é quase um desejo na qual a sua concretização é um direito inaliável. O problema é se esse desejo é o de não servir.
Desde o fim do Serviço Militar Obrigatório já temos uma geração que não passou sequer por pensar que poderia vir a servir nas Forças Armadas, uma geração que nunca teve de pensar que teria que adiar a sua vida para ir assentar Praça sabe lá onde. É uma geração que agora começa já a ter filhos e que não se identifica com esta ideia e que agora poderá muito bem influenciar a próxima geração a também não se identificar com o serviço militar, muito menos um que seja obrigatório.
Sem me querer alargar muito mais, acabo dizendo que o Serviço Militar Obrigatório, se vier a ser reintroduzido, terá de ser um processo genético, ou seja, um processo de vários anos, podendo mesmo ascender para lá dos 15/20 anos.
Sem espaço físico, quadros suficientes, falta de material, dinheiro e vontade da população não existe assim uma cultura de Defesa, e essa terá de voltar a ser cultivada para que depois o Serviço Militar Obrigatório seja plenamente implantado em Portugal.
Assim sendo, e fechando em nota totalmente pessoal, apoiaria a reintrodução de um Serviço Militar Obrigatório reformado à luz do que é a sociedade onde Portugal se insere no Séc. XXI, esperando que este serviço possa ser alargado na sua idade de ingresso, podendo dar assim mais uma oportunidade aqueles que apesar de se terem dado como voluntários, não conseguiram entrar.



quinta-feira, 14 de junho de 2018

A Coreia do Norte e os EUA, um possível Turning point em Singapura?


Com este pequeno texto pretendo olhar de um modo rápido para a história dos acordos entre os EUA e a Coreia do Norte para tentar perceber como é que o que aconteceu em Singapura trás algo de novo ao paradigma da Coreia do Norte e da projecção do Poder dos EUA no Pacífico.
O encontro de Trump com Kim-Il-Jung não é primeiro da sua espécie.
            Em 1994 Jimmy Carter encontrou-se com Kim-II-Sung, o avô do actual ditador da Coreia do Norte.
            Este encontro foi motivado pelo esfriar das relações entre os EUA e a Coreia do Norte após o acordo assinado a 30 de Janeiro de 1992 entre os dois países para a desnuclearização da Coreia do Norte. (disponível aqui: https://www.iaea.org/sites/default/files/infcirc403.pdf ).
            Apesar deste acordo ter entrado em vigor, e apesar do acordo entre a Coreia do Norte e a International Atomic Energy Agency que permitia a entrada de equipas de inspecção na Coreia do Norte, com o propósito de inspeccionarem o complexo nuclear de Yongbyon. Após a entrada dos inspectores no país, mas a negação do acesso aos reactores Norte Coreanos alegando que os inspectores estariam a espiar para os EUA, levou a que os ânimos se exaltassem.
            Para acalmar as tensões e promover o dialogo, Jimmy Carter desloca-se a Pyongyang.
            Desta visita saiu o Acordo de 21 de Outubro de 1994 (disponível aqui: http://www.nti.org/media/pdfs/aptagframe.pdf ).
            Desta feita no ponto 1º a Coreia do Norte deveria receber “light-water reactor power plants”, em substituição dos “graphite-moderated reactors and related facilities”.
            No ponto 2º ambos os lados deveriam caminhar para uma normalização dos laços económicos e políticos. Num período de 3 meses após este acordo ambos os países deveriam aliviar as restrições ao nível de trocas e investimento “including restrictions on telecommunications services and financial transaction”, e ao mesmo tempo dando um upgrade ao nível das relações entre os seus embaixadores.
            Finalmente, no ponto 3º do acordo, “Both sides will work together for peace and security on a nuclear-free Korean peninsula”. Neste ponto a Coreia do Norte voltaria a aceitar os inspectores da International Atomic Energy Agency com vista à implantação do programa dos ”light-water reactor power plants”. Mantendo-se assim a Coreia do Norte dentro do Acordo de 1992.
            O Acordo acabaria por cair por terra em depois de em 2003 os EUA acusarem a Coreia do Norte, em 2002, de ter um programa de enriquecimento de urânio, o que violaria o acordo de 1992.
            Com os descarrilar das relações entre a Coreia do Norte e os EUA, países como a China, a Rússia o Japão e a Coreia do Sul tentam negociar um common ground entre os dois actores.
            Isto levou a que em 2005 se assinasse o Joint Statement of the Fourth Round of the Six-Party Talks
a 19 de Setembro em Beijing (disponível aqui: https://www.state.gov/p/eap/regional/c15455.htm ) (estes 6 seriam a China, a Coreia do Norte, a Coreia do Sul, o Japão, a Rússia e os EUA).
Este documento previa que fossem desenvolvidos 6 pontos, mas para o caso interessa realçar que “The Six Parties unanimously reaffirmed that the goal of the Six-Party Talks is the verifiable denuclearization of the Korean Peninsula in a peaceful manner.
The D.P.R.K. committed to abandoning all nuclear weapons and existing nuclear programs and returning, at an early date, to the Treaty on the Nonproliferation of Nuclear Weapons and to IAEA safeguards
.”.
Seguindo-se este statement, a 13 de Fevereiro de 2007 foi publicado o Initial Actions for the Implementation of the Joint Statement (disponível aqui: https://2001-2009.state.gov/r/pa/prs/ps/2007/february/80479.htm ). Deste acordo sairiam 5 equipas que deveriam tratar os seguintes temas “1. Denuclearization of the Korean Peninsula; 2. Normalization of DPRK-US relations; 3. Normalization of DPRK-Japan relations; 4. Economy and Energy Cooperation; 5.Northeast Asia Peace and Security Mechanism.”.
Também se deve realçar o 4º ponto que afirma que “During the period of the Initial Actions phase and the next phase - which includes provision by the DPRK of a complete declaration of all nuclear programs and disablement of all existing nuclear facilities, including graphite-moderated reactors and reprocessing plant - economic, energy and humanitarian assistance up to the equivalent of 1 million tons of heavy fuel oil (HFO), including the initial shipment equivalent to 50,000 tons of HFO, will be provided to the DPRK.”.
Lendo isto até aprece que tudo poderia ter um final feliz, no entanto este Statment acontece um ano e meio depois do primeiro teste nuclear Norte Coreano.
Como sabemos, as capacidades nucleares da Coreia do Norte só viriam crescimento. Recuperando-se um estado de relações precoces e instáveis.
Só a 29 de Fevereiro de 2009 em Beijing é que viria a ser declarado um Moratorium (um período de pausa ou atraso) “on long-range missile launches, nuclear tests and nuclear activities at Yongbyon, including uranium enrichment activities“ (disponível aqui: https://2009-2017.state.gov/r/pa/prs/ps/2012/02/184869.htm ).
De realçar que os EUA afirmam que querem manter o Joint Statement de 2009, e nada de novo trás este novo contacto.
Em 2013, mais especificamente a 31 de Março, Kim-Jong-Un afirma que: “The DPRK's nuclear armed forces represent the nation's life which can never be abandoned as long as the imperialists and nuclear threats exist on earth. They are a treasure of a reunified country which can never be traded with billions of dollars.” (disponível aqui: https://kcnawatch.co/newstream/1451895560-172035864/report-on-plenary-meeting-of-wpk-central-committee/ ).
Isto depois do 3º teste Norte Coreano de um dispositivo nuclear em Fevereiro desse ano.
A resposta do então Presidente Obama foi a de impor pelo conselho de Segurança da ONU, uma nova lista de sanções à Coreia do Norte. Uma resposta mais que moída e remoída por parte do Ocidente e dos EUA em relação à Coreia do Norte.
Desde então, com a eleição de Donald Trump como Presidente dos EUA o líder da Coreia do Norte mudou o seu discurso.
Talvez como reacção a um perfil mais agressivo e realista por parte do líder americano, a 20 de Abril deste ano, no 3º plenário do 7º Comité central do Partido dos Trabalhadores da Coreia Kim-Jong-Un (disponível aqui: https://kcnawatch.co/newstream/1524400229-922732211/3rd-plenary-meeting-of-7th-c-c-wpk-held-in-presence-of-kim-jong-un/) afirmou que  “the historic tasks under the strategic line of simultaneously developing the two fronts set forth at the March 2013 Plenary Meeting of the Central Committee of the Party were successfully carried out.”, ou seja, que o programa nuclear Norte Coreano teria atingido os seus objetivos de assegurar a paz para a Coreia do Norte, assim, desta feita, a Coreia do Norte iria “accelerate the advance of our revolution by concentrating all our efforts on socialist economic construction”, realçando que, a longo termo, o objetivo da Coreia do Norte seria o de crescer economicamente e industrialmente.
He [Kim-Jong-Un] urged the economic guidance organs including the Cabinet to occupy their position as the master responsible for the economic affairs, meticulously organize the operation and command for making rapid economic progress. He also urged all the fields and units to be unconditionally subordinate to the unified command of the Cabinet for implementing the economic policy of the party”.
Estes avanços seriam possíveis virando o foco do especto nuclear para o especto da educação e da ciência.
Só o futuro dirá se realmente haverá esta mudança, no entanto, o recente encontro entre o Presidente dos EUA e o líder da Coreia do Norte resultou, mais uma vez, na promessa de desnuclearização da Coreia do Norte.
Apesar desta promessa já ter muito anos (como demonstrado acima), o discurso interno de Kim-Jong-Un para o seu comité central é algo de novo.
Talvez em preparação para o seu encontro com Donald Trump, ou mesmo representando uma vontade real de mudar o vector do Estado Norte Coreano, Kim-Jong-Un deu um passo novo com este discurso interno, mostrando que, se mais nada daqui sair que, já ao nível interno, a Coreia do Norte sentiu a pressão exercida por Donald Trump, uma pressão que nunca teria sido aplicada até agora.
No entanto o entusiasmo que isto possa causar tem de ser resfriado com um olhar mais afastado para a linha cronológica.
Como foi dito, os acordos ou statments eram sempre levados a cabo depois de testes militares Norte Coreanos, ou seja, a Coreia do Norte tem um historial de criar crises para de seguida se aproveitar da sistemática acção dos EUA e do Ocidente para chegar a novos acordos, levando sempre a sua avante e continuando com o seu programa nuclear até ao seu ponto actual.
É claro no documento que desde o início dos anos 90 a preocupação é a desnuclearização da Coreia do Norte, mas esta nunca aconteceu, portanto pouco faz acreditar que agora aconteça.
Mas tem de ser notada a façanha mais realista de Donald Trump que, sem duvida, pressionou quer para o acordo de paz entre as duas Coreias quer para o recente encontro e o recente discurso interno de Kim-Jong-Un de redireccionar a Coreia do Norte para outro caminho.
A mudança de carácter e de possível resposta por parte dos EUA face à Coreia do Norte e o discurso de Kim-Kong-Un parecem ser os dois factores novos da equação.
Até agora, para fins internos, o programa nuclear era o principal objectivo da Coreia do Norte, e só por aí poderiam colocar-se numa posição de força contra o Ocidente, agora até o discurso interno é outro.
Isto poderá ser um indicador que as Teorias Realistas das Relações Internacionais não são tão desadequadas quanto se viria até agora a pensar. Uma capacidade americana de responder agressão com uma maior agressão parece ter feito a Coreia do Norte recuar.
Em Singapura deixa de existir um esforço conjunto (dos EUA e da Coreia do Norte) para passara a existir um compromisso da Coreia do Norte para essa desnuclearização da Coreia do Norte: “Reaffirming the April 27, 2018 Panmunjom Declaration, the DPRK commits to work toward complete denuclearization of the Korean Peninsula.” (disponível aqui:https://www.whitehouse.gov/briefings-statements/joint-statement-president-donald-j-trump-united-states-america-chairman-kim-jong-un-democratic-peoples-republic-korea-singapore-summit/ ).
Por ultimo, e para não prolongar demasiado este texto, tem que ser entendida a posição da China neste contexto.
A China sempre foi o principal parceiro da Coreia do Norte, no entanto, em tempos recentes, as próprias políticas e aspirações chinesas tem sido alvo de Donald Trump.
As aspirações marítimas chinesas vêem-se a defrontar a posição americana no Indico e no Pacifico. Um continuar das hostilidades crescentes entre a Coreia do Norte a os EUA só daria mais desculpas para o reposicionamento de mais meios navais, aéreos e terrestres americanos no teatro do Pacífico, o que seria uma ameaça para a expansão marítima chinesa.
Um acalmar das tensões entre a Coreia do Norte e os EUA poderá ser o que a China precisa para respirar com mais calma. Mesmo com o cenário de repetição de eventos passados e de uma nova vaga de tensões, a China ganha breves momentos para respirar, podendo ela lidar com situações no Mar do Sul da China estando a atenção da Comunidade Internacional virada para as relações da Coreia do Norte com os EUA.
Mas no caso de Singapura ser realmente um Turning Point, o que acontecerá à posição americana no Pacifico?
A área de expansão por excelência dos EUA sempre foi o Pacifico. No caso de realmente se estar a escrever uma página nova, prevejo o surgimento de pequenos embates entre os aliados e parceiros americanos (como Índia, Japão, Coreia do Sul e Indonésia) e as aspirações da China no Mar do Sul da China e no Indico que permitam aos EUA continuar a projectar Poder para o Pacífico com a desculpa de estar a auxiliar os seus aliados e parceiros contra uma agressão da China.
Tal como o recuo da URSS depois de 1991 levou a que pequenos conflitos assumissem papel central na intervenção dos EUA no Médio Oriente até à actualidade, e o mesmo se passará no Pacífico no caso da retracção do “Grande” perigo da Coreia do Norte no Pacífico.
Se por outro lado a história se voltar a repetir penso que estes dois modelos se iram desenvolver em conjunto, por um lado a desculpa do perigo Norte Coreano e por outro e diversos e pequenos (grandes) choque entre a China e os diversos actores no Mar do Sul da da China continuaram a ser desculpa para a projecção de Poder americano na área.




sábado, 28 de abril de 2018

Não abram já o Champanhe; os recentes desenvolvimentos Coreanos

I - Contexto

A Coreia do Norte (RPCN) é uma ditadura nacionalista e socialista, que faz do isolacionismo, tradicionalismo e da auto-suficiência a sua essência como nação. Esta afirmação sintetiza o Juche, que é a ideologia da Coreia do Norte (…A concretização da independência política, da auto-suficiência económica e da autonomia da defesa nacional são os princípios que o governo mantém de forma consistente)

A liderança da Coreia do Norte, pela família Kim, considera a aquisição de armas nucleares o único meio de garantir sua sobrevivência regional e mundial. (Deterrence theory). A RPCN tem todo o direito, como Israel ou o Irão, de ter armas nucleares e não vejo que os EUA possam ser definidores de quem possa ou não as ter. Neste post, no entanto, pretendo analisar os recentes esforços no caminho da desnuclearização, dado que é isso que o Mundo Ocidental mais claramente pede à Coreia do Norte.

A Coreia do Norte ratificou o Tratado de Não-Proliferação Nuclear em 1985, mas retirou-se em 2003, quando foi descoberto que continuava a enriquecer Urânio. Realizou o seu primeiro teste nuclear três anos depois. Desde essa data várias rondas de negociações bilaterais e multilaterais destinadas a desnuclearizar a Coreia do Norte fracassaram. Clinton e Bush foram os grandes perdedores. Pyongyang já assinou dois acordos, tendo-se retirado unilateralmente dos mesmos; o da Agência Internacional de Energia Atómica e o de Não-Proliferação Nuclear. Violou o acordo de desnuclearização inter-coreano, violou o acordo de 1994, a declaração conjunta de 2005 e os acordos dos anos de 2007 e 2012.

Neste momento a Coreia do Norte tem capacidade para atingir os EUA tendo Kim anunciado que a sua politica byungjin foi alcançada.

II – Cenário Futuro

Kim Jong-un afirmou que só se vai desnuclearizar depois de os Estados Unidos e a Coreia do Sul negociarem um tratado de paz com ele para terminar formalmente a Guerra da Coreia. Esse processo já começou no passado dia 26 de Abril, num encontro bilateral com o seu homólogo da Coreia do Sul, Moon Jae-in – um homem que tudo tem feito para a reunificação se dar, apesar de ser considerado por Kim um “fantoche de Trump”.

É meu entendimento que Pyongyang não quer nem a paz nem nenhum tratado. A RPCN quer a negociação de um tratado de paz e quanto mais demorada e inconclusiva for a negociação melhor. Ao levar os Estados Unidos a um processo de paz, Kim espera que o seu estatuto de líder mundial seja credibilizado por se sentar à mesa de Trump, que os seus crimes contra o seu povo sejam relativizados, que o seu regime seja legitimado, que a Coreia do Sul baixe suas defesas. Kim pretende induzir os EUA e a ONU a suspenderem as sanções e, eventualmente, a conseguir que as tropas dos EUA se retirem da Coreia do Sul. Quando chegar a hora da verdade, Pyongyang vai acabar por rejeitar os pedidos de verificação dos EUA e da ONU ao material nuclear e dir-se-á disponível para novas concessões com mais exigências e mais provocações. A tudo isto a China assistirá em silencio.

Eventualmente a única forma de desnuclearizar a Coreia do Norte reside em convencê-la de que se deve desarmar e reformar ou irá desagregar-se como a URSS. Isso exigirá que os Estados Unidos, apoiados pelos seus aliados, continuem uma campanha de subversão política e isolamento financeiro, continuando a sancionar e a apontar quais os bancos chineses que mantêm relações ilegais com bancos norte-coreanos e que têm sido fundamentais para o programa nuclear da RPCN. A pressão internacional para que os bancos relatem a propriedade norte-coreana de ativos offshore tem de ser forte. Esta estratégia, no entanto, é de difícil resolução pois neste momento as relações com Xi Ji Ping não são as melhores, sendo a China para Trump o grande obstáculo a “tornar a América grande outra vez”.

É exequível, no entanto, que os Estados Unidos e a Coreia do Sul continuem a apostar em apoiar activamente as deserções de diplomatas e políticos norte-coreanos como os que expuseram parte da rede de lavagem de dinheiro de Pyongyang.

Não pensem que não concordo que a reunião das Coreias é de facto um objectivo a prosseguir. Se as questões socias e de direitos humanos são inquestionáveis, em termos económicos a reunificação seria muito mais lucrativa do que se pensa. Seul poderia reduzir drasticamente os seus gastos com defesa, que actualmente atinge $ 30 bilhões US por ano, ou 2,5% do PIB. Um número que exclui os $ 1 bilhão US que Washington concede anualmente para ajudar a cobrir os custos da presença militar dos EUA na península. A Coreia do Sul poderia também acabar com o recrutamento universal e reduzir os seus 680.000 militares para 500.000 ou menos, libertando um grande número de pessoas.

Com o tempo, uma Coreia reunificada, com uma população de 75 milhões de trabalhadores, poderia emergir como uma potência industrial e consumidora; uma verdadeira Alemanha da Ásia. À medida que duas economias se unissem novas oportunidades de investimento surgiriam. Segundo um relatório de 2009 do Goldman Sachs, dentro de 30 a 40 anos, a península reunificada, poderia ultrapassar a França, a Alemanha e até o Japão em termos de PIB. Os actuais parceiros comerciais da Coreia do Sul - especialmente os dois maiores, a China e os Estados Unidos - beneficiariam imensamente dessa nova fonte de vitalidade económica.

O facto é que não me parece que assistiremos a este caminho tão depressa, pois não há qualquer indício concreto que Kim abandone a estratégia e as políticas iniciadas por seu avô e continuadas por ele e seu pai. A cimeira com Trump será muito importante na validação ou negação desta hipótese.

O conceito de tempo dos Orientais é diferente do nosso e numa negociação quem quer resultados rápidos parte em desvantagem. Kim tem todo o tempo do Mundo. Trump nem por isso. Por isso malta, não abram já o Champagne.


sábado, 21 de abril de 2018

Cercado


“We’ll be coming out of Syria, like, very soon, Let the other people take care of it now. Very soon, very soon, we’re coming out, we’re going to get back to our country, where we belong, where we want to be.” Duas semanas após estas palavras de Donald Trump e na sequência de bombardeamentos da aviação síria e russa em Ghouta oriental, Bashar é acusado de atacar os habitantes com recurso a gás cloro. A linha vermelha traçada por vários lideres ocidentais, inclusive por Trump, tinha sido ultrapassada. Outra vez.

Vamos por de parte a questão se houve ou não ataque com gás, algo que ninguém de facto tem a certeza. Vamos por de parte a questão de que um ataque de Bashar nesta altura com gás não faz qualquer sentido. Para os media internacionais Bashar voltou a fazer o que tantas vezes foi avisado para não fazer; gazear o seu próprio povo. 

Nos últimos meses, Trump e o “enfim terrible” Macron ameaçaram com o uso da força se o regime Sírio passasse novamente a " linha vermelha " das armas químicas.

Após o ataque com Sarin a Ghouta, em 2013 Obama teve que escolher entre efectivar as suas ameaças de intervenção militar se o regime usasse armas químicas - arriscando-se a atolar os US num conflito que não estava nas suas prioridades geopolíticas - ou a não intervir, perdendo a credibilidade aos olhos do mundo e aceitando o domínio Russo, e por acréscimo do Irão nestes territórios. Obama escolheu a segunda opção.

Trump após sua eleição condenou essa escolha, e no ano passado optou por intervir, mas em pequena escala num ataque dirigido apenas a eliminar os locais de produção e armazenamento de armas químicas na área e não para derrubar o regime de Assad. Dessa vez anunciou o ataque dias antes, dando ao regime sírio tempo suficiente para evacuar seus activos militares para bases russas ou para o aeroporto civil de Damasco. Em segundo lugar, os Estados Unidos alertaram os russos para evitar acidentes com as forças russas. Em terceiro lugar apenas três locais militares vazios foram atingidos.

Mais uma vez, a antecipação com que Trump alertou a Rússia e a Síria sobre os seus  objectivos e a precisão dos três ataques, sem gerar vitimas e contra instalações que se diz serem utilizadas para produzir e armazenar armas químicas, indicam que por trás deste ultimo ataque não há intenção de intervir em grande escala, o que realmente elevaria as tensões com a Rússia para níveis muito perigosos, mas sim de ter de intervir por uma questão de credibilidade internacional, de manutenção da sua palavra após as ameaças que proferiu. Isto é, Trump parece capturado por aqueles a quem não interessam que os US saiam da Síria e a deixem entregue aos Sírios e aos entendimentos regionais que se estabeleceram com o Irão e com a Russia.

Quem ganhou com tudo isto? 1)  O regime Sírio - e por acréscimo a Rússia - porque acabou com a resistência em Ghouta, recuperando o controle do território e marcando a sua vitória militar mais importante depois de Aleppo em 2016; 2)  Macron e May aflitos na popularidade interna e desejosos de mostrar poder; 3)    Todos aqueles que se recusam a que os Estados Unidos da América reduzam a sua presença militar no Médio Oriente, seja porque a instabilidade lhes interessa para que a atenção do Mundo árabe não volte a recair sobre eles, como é o caso de Israel, seja porque tem muito a ganhar com a guerra e com o intervencionismo militar como é o caso do complexo militar-industrial norte-americano seja ele de inspiração mais lib-dem ou neo-com.

Todos estes conseguiram colocar Trump, que tantas vezes se apresentou como não -intervencionista, numa posição em que ele nunca quis estar, tendo que "fazer alguma coisa" para não perder a face depois de meses de ameaças. O Presidente americano parece cada vez mais capturado pelo meio ambiente que o circunda, e pelo deep state, o que é de facto uma desilusão. As tropas, essas, vão continuar por lá.



terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

Putin, o período 2008 - 2016

Impossibilitado de concorrer a terceiro mandato, Putin apoia e acompanha Medvedev na candidatura à Presidência da Rússia para o período 2008 – 2012. O período Medvedev fica marcado pela tentativa de voltar às abordagens mais liberais, económica e socialmente. No entanto anúncio da recandidatura de Vladimir Putin à presidência em Setembro de 2011 demonstra a necessidade de repor os alinhamentos de poder, face as tensões e conflitos intra-Kremlin, entre conservadores e liberais. 

Medvedev conseguiu promover um desanuviamento nas relações, apesar da guerra na Geórgia. O retomar de relações diplomáticas e o reforço de relações bilaterais devem ser referidos, a par da postura de maior abertura que contribuiu para o desanuviamento nas relações da Rússia com os seus parceiros ocidentais. Internamente, a modernização foi bem acolhida, mas não teve tempo suficiente para se inscrever nas vivências da Republica, tendo o efeito de potenciar a maior mobilização social, o que ampliou o espaço para vozes de descontentamento e maiores reivindicações em termos de reformas políticas – um desenvolvimento que a elite no poder, especialmente centrada em Vladimir Putin, não podia aceitar.

Medvedev trouxe ainda uma política económica de diversificação de investimentos, para ultrapassar uma excessiva dependência dos recursos energéticos. Promoveu também a política de investigação, inovação e desenvolvimento tecnológico como novo vector na política externa russa, ao permitir não só a consolidação de desenvolvimentos internos, como também a promoção de cooperação com parceiros externos, em diferentes áreas sectoriais.

O regresso de Putin à presidência russa na Primavera de 2012 com 64% dos votos significa o regresso das políticas centralizadas, a redução da participação popular nos processos de decisão e o afastamento de elementos mais progressistas. A autoridade centralizada é reconhecida como estrutura basilar de actuação e desenvolvimento das políticas internas e externas.

Este terceiro mandato de Putin fica marcado pela continuidade estratégica da política realista e pelo acentuar da assertividade em relação ao Ocidente que se materializou na mais greve crise europeia pós-guerra; A anexação da Crimeia pela Rússia em 2014.

As revoluções coloridas - Geórgia (2003), Ucrânia (2004), e no Quirguistão (2005), - constituíram uma contestação social e política que marcaram a política russa, espelhando o receio em Moscovo de perda de influência nestes espaços. A Rússia sempre desejou manter uma influencia nos países da CEI, procurando sempre evitar desenvolvimentos contrários aos seus interesses geopolíticos e geoestratégicos. Essa vontade foi mais marcada por Putin, em países como a Geórgia ou a Ucrânia. Ele viu, em particular nesta ultima, com enorme desconfiança, as manifestações populares pró-europa, que considerou serem parte de um esquema ocidental para promover reformas contrárias aos interesses russos e promover a aproximação da Ucrânia às instituições euro-atlânticas. 

Um país que adopta a soberania e a independência associada a realpolitik como elementos charneira da sua PE, não aceitará nunca que, o país onde se localizam muitas das empresas e fabricas do complexo militar-industrial Russo, bem como um território histórico do imaginário colectivo , seja visado pela integração na OTAN e na EU. Putin sempre deu sinais de que recorreria ao poder militar para controlar qualquer acção no espaço Ucraniano.

Visando reverter as dinâmicas em curso e mantendo o país na sua esfera de influência, a Rússia envolveu-se militarmente nesta crise. Apesar de ter usado um vasto leque de instrumentos económicos e diplomáticos para atingir os seus objectivos, o apoio político e militar a movimentos separatistas no Leste e Sul da Ucrânia e a anexação da Crimeia a 18 de Março de 2014 constituem os pontos mais significativos da sua estratégia na região.

A não reacção da OTAN nestes processos deu indicações à liderança russa que este é o caminho certo. Putin marcou as fronteiras de intervenção, dando um sinal a todos os países do espaço CEI do que é que ocorrerá caso haja afastamentos de “linha definida” por Moscovo, reforçando a sua afirmação no palco internacional.



sábado, 3 de fevereiro de 2018

Putin, o período 2000 – 2008

Vladimir Vladimirovich Putin, nasceu em Sto Petersburgo em Outubro de 1964. Licenciou-se em Direito pela Universidade Estatal de Leninegrado e integrou o KGB e a Câmara de Sto. Petersburgo. Chega à política pela mão de o seu ex-professor e amigo Anatoly Sobchak. É no entanto, Ieltsin quem lhe dá surpreendentemente todo o protagonismo ao nomeá-lo presidente interino. Putin ganha a eleição de 2000 e torna-se o segundo Presidente da Federação russa.

A quando da chegada sua chegada ao poder, a economia estava num estado desastroso e as burocracias imperavam, bloqueando qualquer tentativa de pôr em prática as políticas decididas pelo Kremlin. O período anterior de Yeltsin tinha aumentado o poder financeiro de vários empresários que ganharam influência tomando parte nas decisões que regiam a Federação e a sua política externa. Putin tinha que agir, não confrontando directamente esta elite, mas de forma a instalar no poder os seus mais próximos. Numa Rússia enfraquecida, Putin iria limitar-se inicialmente a gerir a debilidade estratégica em que o país se apresentava e a controlar os danos dela resultantes.

Vladimir Putin deu início ao seu mandato com três objectivos que não eram necessariamente os seus: 1) continuar a liberalizar os mercados reforçando a ligação comercial aos países europeus, 2) melhorar as relações com o Ocidente (encerramento de bases militares em diversas partes do mundo, aproximação à OTAN) e 3) centralizar o poder nas mãos daqueles que considerava serem os seus apoiantes mais próximos iniciando um processo de verticalização e hierarquização do mesmo a partir dele. 

No 11 de Setembro de 2001 Putin viu a sua hipótese de se colocar na vaga de fundo da luta global contra o terrorismo, problema que muito perturba a política doméstica da Federação. Desta forma poderia, não só utilizar esse motivo como elemento de relação próxima com o ocidente, mas acima de tudo, ter a legitimidade para intervir militarmente em zonas onde a instabilidade poderia contaminar seriamente à sua política doméstica, como o foi a Tchetchénia. Ao mesmo tempo ele pensava que poderia beneficiar de apoios financeiros, políticos e diplomático dos países e instituições ocidentais. A reaproximação à OTAN e ao ocidente tinha um objectivo claro; beneficiar da “boa vontade” destes para aceder aos mercados e legitimar acções mais assertivas, sem ser criticado ou contestado. Nada disto aconteceu nas quantidades e com as qualidades que Moscovo esperava.

O período 2000 – 2004 é marcado, ao nível dos acordos entre as partes, pelo APC e o acordo sobre os quatro espaços comuns, documento de referência das relações bilaterais. Este era um acordo de carácter amplo em termos de áreas de actuação - espaço económico comum; espaço comum de liberdade, segurança e justiça; espaço comum de cooperação no âmbito da segurança externa; e espaço comum de investigação, educação e cultura - segue os pressupostos de diálogo e cooperação. Podemos interpretar a criação dos quatro espaços comuns como uma necessidade para enfrentar o alargamento a leste da União Europeia em 2004. O “conceito de “quatro espaços comuns” pode ser visto como uma aproximação à UE, porque os quatro espaços cobrem todos os campos das actividades desta. Outra componente do quadro de cooperação institucionalizada é a referência a valores e princípios comuns contidos em todos os documentos e essenciais para uma “parceria UE-Rússia”

A base legal das relações entre a Rússia e a UE é o Acordo de Parceria e Cooperação (APC), que entrou em vigor a 1 de Dezembro de 1997. Este foca-se em bases legais para a promoção da democracia, o estado de direito, o pluralismo e os direitos humanos. Este documento de partilha de princípios teve, no entanto, entendimentos diferenciados dos parceiros envolvidos. De alguma forma os valores presentes no documento e a sua potencial extensão ao espaço CEI, tão caro à Rússia, não foi nunca visto da mesma maneira pela Europa e pela Rússia. 

Apesar da sua renovação anual automática, foi sempre complexa a renegociação de novos textos. É de referir que, aquando da assinatura do APC, a Rússia apresentava-se muito constrangida no seu poder no sistema internacional. Esta foi a principal razão pela qual os seus principais interesses foram colocados em segundo plano, o que viria a afectar negativamente a postura da Federação russa, na sua tentativa de se reafirmar enquanto grande potência regional e internacional.

Em síntese, tivemos um período de Politica Externa russa para com a Europa onde se deu a combinação de uma visão já realista de defesa do interesse nacional com a procura de cooperação e vantagens competitivas para a Rússia, de que são exemplo a ligação a estruturas ocidentais e as nações unidas. Putin respondia assim às três fortes tendências internas que se manifestavam e que ele nesta fase tinha de equilibrar; a ala europeísta, a ala orientalista e os nacionalistas. 

O segundo mandato de Putin marca uma inversão de atitude em relação ao Ocidente, passando do tom cooperativo para o tom antagónico, com o momento critico a ser atingido com o discurso de Putin na conferência de Munique em 2007. Nessa conferencia Putin afirmou que o fim da guerra fria produziu muito mais vítimas e conflitos armados do que antes. A tentativa de resolver os problemas pela acção unilateral do Ocidente, causou imensas tragédias humanas. Num ataque ao Ocidente e a OTAN ele disse que tinham desprezado os princípios básicos do direito internacional e que promoviam uma nova corrida armamentista no mundo. "Os EUA ultrapassaram suas fronteiras nacionais em quase todas as esferas, quem pode estar satisfeito com isso?" - e acrescentou que "ninguém se pode sentir seguro" nesta paisagem política. 

O que explica essa inversão notável? A resposta reside na resolução de uma tensão central entre dois impulsos fundamentais, mas opostos, no projecto inicial de Putin: restabelecer um estado forte, centralizado e controlador e construir um país próspero através da integração na economia global. O primeiro implica um forte controlo centralizado do estado sobre os cidadãos e as instituições enquanto o segundo implica fluxos de bens e dinheiro autónomos e horizontais através das fronteiras, ligando a Rússia a actores e jurisdições além do seu alcance formal. Uma plena abertura não é passível de ser controlada nem planeável, achando Putin que qualquer resultado será sempre o resultado do controle por outros nomeadamente Ocidentais. Putin e os seus oligarcas não concebem o conceito de “mercados”, nem nada que não seja determinado pela concepção e poder de alguém. Assim, Putin decidiu tomar em mãos o que estava além do seu controle. 

Esta mudança também se alicerça na galvanização das elites alinhadas com Putin, galvanização essa baseada na recuperação económica russa neste período - os recursos energéticos russos permitiram um crescimento económico sustentado de cerca de 7% ao ano entre 2003 e 2008 - e numa assertividade internacional expressa nas estratégias energéticas nacionalistas provocadas pela mudança de atitude de Bruxelas face a Moscovo após o último alargamento a Leste. Putin e o Kremlin manifestaram o fim da aceitação passiva do seu estatuto e papel secundário na ordem pós-bipolar.

Putin irá utilizar a energia e a sua distribuição como ferramenta política esquecendo os critérios estritamente comerciais, o que iria revelar a vulnerabilidade da UE em relação aos fornecimentos de energia oriundos da Rússia. Os gasodutos e oleodutos que atravessavam os antigos países comunistas passariam a ser os instrumentos estratégicos para o exercício do «poder energético» que o Kremlin visava maximizar para transformar a Rússia numa grande potência.

A instrumentalização pelos seus oligarcas das débeis instituições democráticas e a necessária centralização do poder, obrigavam a nacionalizar o poder energético russo, o seu mais poderoso activo politico para condicionar a acção dos países CEI e da UE. Foi justamente o domínio deste sector que colocou nas mãos do Kremlin os vastos recursos necessários para prosseguir os seus objectivos geopolíticos. O desmantelamento dos ténues resultados da democratização russa e a politização dos sectores-chave da economia não foram, portanto, acasos que poderão ser alterados, mas sim a base critica operativa que viabiliza a estratégia de Vladimir Putin.

Não podemos também dissociar desta alteração de comportamento de Putin, a reacção ao sentimento de humilhação nacional sentida pelas elites russas de inclinação mais nacionalista e euroasiáticas. A fraqueza russa materializou-se na aceitação resignada da imposição de políticas, económicas e sociais, que se revelaram mal sucedidas para o seu povo, mas benéficas para alguma elite “soviética”, quiçá a mais liberal e, também na sua irrelevância política, não sendo capaz de se opor aos alargamentos da OTAN e não conseguindo atrair os países do ex-espaço soviético para a sua órbita de influência.” 

Assim, é latente neste período o confronto entre duas visões de Europa. Após a inicial convergência ideológica resultado de um período de fraqueza estratégica da Republica, Putin recupera a criação de tensões com o Ocidente como meio para, interna e externamente, dar o sinal de que pretendia recuperar para a Rússia o estatuto de potencia Mundial. Putin defende uma Europa de estados fortes e independentes, onde as identidades são mais ricas e plenas que qualquer tipo de integração ou intenção transnacional. Para Moscovo, o estado deve ser soberano, assim como a Democracia que se deve moldar aos interesses políticos da Nação e não ao bem-estar e a liberdade. A visão russa da ordem política europeia é também ela revisionista, numa abordagem hierárquica do poder dos estados assente em esferas de influencia e uso de hard power nas abordagens expansionistas e de que a intervenção na Geórgia e na Ucrânia são exemplos paradigmáticos. 

A visão do Mundo russa centrada no estado relaciona-se directamente com uma preferência por relações bilaterais ao invés das relações supranacionais com Bruxelas e muitas vezes este entendimento reflecte uma suspeição em relação a actividades transfronteiriças. Esta é uma visão diametralmente oposta do liberalismo democrático ocidental, que suporta a coesão dos estados da EU. É também uma visão que mostra a falência de todos os acordos pré-período 2004 que pretendiam e pretendem a acomodação da Rússia aos valores ocidentais.




domingo, 21 de janeiro de 2018

Trump, passou um ano e estranhamente o Mundo não acabou !

20 de janeiro de 2018 marca o primeiro aniversário da governação do presidente americano, Donald Trump, na Casa Branca. O início de seu mandato presidencial anunciava uma ruptura em relação ao governo de Obama, sobretudo no campo da política externa e das escolhas relativas à segurança do país.

No período de campanha Trump apresentou uma retórica anti-intervencionista, criticando o governo anterior essencialmente pelos gastos nas missões no exterior.

Uma vez instalado na Casa Branca, Trump não tem sido consistente com a intenções anunciadas. Num ano de mandato, a presença dos EUA em todo o mundo aumentou, o budget militar aumentou dando o President Of The United States (POTUS) indicações de estar disposto a recorrer ao uso da força militar para lidar com situações entendidas como ameaçadoras para os EUA. Como explicar esta incoerência ? 

O não-intervencionismo intervencionista
Entre Janeiro e Novembro de 2017, os EUA realizaram 30 ataques aéreos na Somália contra militantes al-Shabaab, dos quais 14 apenas em agosto, marcando um forte crescimento em relação às operações realizadas nos anos anteriores. Entre 3 e 4 de novembro de 2017, foram realizadas as primeiras operações aéreas americanas contra o Estado islâmico no país africano.

O número de bombardeamentos também aumentou no Iêmen, onde os EUA realizaram a primeira operação aérea contra ISIS em 17 de outubro, em Al Bayda, onde foram atingidos campos de treino terrorista. Atualmente, os EUA são a única força que ataca com drones no Iêmen. 

No final de Novembro de 2017, foi decretada na Síria e no Iraque a derrota militar do Estado islâmico. No entanto, na Síria, os  Estados Unidos decidiram permanecer, a fim de evitar o renascimento da organização e facilitar a obtenção de uma solução política. isto apesar de Putin, o grande obreiro da vitória, ter declarado que grande parte das suas tropas abandonariam o território. 

Em 21 de Agosto de 2017, Trump inaugurou uma nova estratégia para o Afeganistão, aumentando as tropas dos EUA de 11.000 para 15.000 no país asiático, onde se espera que permaneçam por mais anos de forma a estabilizar o governo de Cabul e eliminar a ameaça de grupos armados locais e do Daesh. De acordo com este objetivo, Trump atacou o Paquistão , acusando-o de ser um porto seguro de terrorismo. Após meses de conversações interrompidas, a situação piorou ainda mais com o início de 2018, quando o presidente dos EUA decidiu suspender a ajuda militar em Islamabad, para convencê-lo a aumentar os esforços na luta contra grupos terroristas.

Em 13 de Outubro de 2017, foi uma data particularmente importante que caracterizou as relações com o Irão, o principal inimigo de Washington no Médio Oriente, quando Trump anunciou a  descertificação do pacto nuclear , assinado em 14 de julho de 2015. O movimento não levou ao fim do pacto, mas estabeleceu as bases para uma revisão dos termos do acordo. 

Outra data importante na política externa de Trump foi 6 de dezembro de 2017, quando o líder da Casa Branca anunciou que iria reconhecer Jerusalém como a capital de Israel e que pretendia mudar a embaixada americana de Tel Aviv para a Cidade Santa. Este movimento despertou a oposição da comunidade internacional, aumentando também as tensões entre palestinos e israelenses, de tal forma que o Hamas incentivou uma nova Intifada. O reconhecimento de Jerusalém como a capital de Israel é um assunto delicado, uma vez que a cidade é um local religioso fundamental tanto para os muçulmanos como para os judeus, como resultado, tanto os palestinos como Israel aspiram a proclamar a cidade capital do seu estado. A comunidade internacional acredita que esta questão deve ser decidida somente em ambiente de conversações de paz entre Israel e a Palestina. 

Em relação à Ásia, o primeiro ano da presidência de Trump foi caracterizado pela inusitada tensão com a Coréia do Norte, em grande parte criada ostensivamente por Trump. Em particular, nos meses de verão de 2017, as tensões aumentaram gradualmente devido à escalada de demonstrações de forças entre Pyongyang, por um lado, e Washington e Seul, por outro. Entre os momentos de maior tensão, lembramo-nos de 29 de novembro de 2017, quando a Coréia do Norte anunciou que se tornou uma  potência nuclear, graças ao teste de mísseis Hwasong-15, capaz de alcançar qualquer parte do território dos Estados Unidos. Com esse lançamento, Kim Jong-un alcançou o objetivo de transformar a Coréia do Norte numa potência nuclear capaz de se defender dos Estados Unidos. Por outro lado, ao longo de 2017, os EUA continuaram a realizar uma série de exercícios militares conjuntos com a Coréia do Sul, e às vezes com o Japão, o que irritou o líder norte-coreano, que se sentiu particularmente ameaçado. Embora Trump tenha afirmado repetidamente que não estava disposto a falar com o líder norte-coreano, no dia 11 de janeiro, durante um telefonema com o presidente sul-coreano, Moon Jae-in, o presidente americano disse que estava disposto a conversar com a Coréia do Norte . Essas declarações marcaram uma mudança de atitude em relação a Pyongyang, um estranho volte face. Durante o verão, Trump prometeu destruir a Coreia do Norte, se ela continuasse a representar uma ameaça para os EUA e, recentemente, declarou que estava pronto para pressionar o botão nuclear, muito maior que o norte-coreano (“much bigger and more powerful). Trump repetidamente instou a China, o principal parceiro comercial de Pyongyang, a exercer mais pressão sobre estes e a suspender o desenvolvimento do programa nuclear e de mísseis. Nas últimas semanas, o presidente americano elogiou Pequim por diminuir drasticamente as exportações de petróleo e carvão para a Coréia do Norte, atingindo os níveis mais baixos desde 2014 e atacou a Rússia de Putin que segundo ele compensou negativamente o trabalho Chinês.

Quanto às relações com a Rússia, o primeiro ano da presidência de Trump foi de romance à distância com um momento bonito na conferencia do G20 em Hamburgo e com alguns arrufos, ao qual não foi imune toda a polémica de interferência da Rússia nas eleições americanas fato de que o líder da Casa Branca sempre negou. Apesar de extensas investigações federais nada se provou. O arrufo maior – que muitos como eu pensaram que fosse critico – foi a intervenção norte-americana na Síria, o ataque a uma base aérea na província de Homs. O momento mais recente foi de afecto, com Putin a parabenizar o sucesso da presidência de Donald Trump neste primeiro ano.

A Doutrina Trump
Não me vou dedicar a analisar o que não diga respeito à politica externa dos USA, pois não me sinto habilitado para o fazer e é sobre esse tema - relações internacionais e politica externa - que, na sua globalidade, este blog diz respeito mas, gostaria de recordar, que Trump no seu primeiro discurso prometeu a todos os americanos que a sua administração seria guiada por uma convicção: estava ali para servir os cidadãos americanos e todas as decisões sobre comércio, impostos, imigração, entre outros assuntos seriam para beneficiar os americanos e as suas famílias. O seu primeiro ano no cargo foi a história de promessas mantidas; Uma economia a crescer, desemprego a descer, impostos a descer, a saída do Trans-Pacific Partnership promovendo a negociações bilaterais, combate a emigração ilegal, o desmontar de um sorvedouro chamado Obamacare. Pode o mainstream media fazer a campanha que quiser, os EUA estão muito melhor com Trump do que com Hillary ou Sanders. Talvez estejamos mal-habituados, mas manter promessas eleitorais devia de ser a pratica habitual de qualquer politico. De alguma forma votamos neles em função da avaliação que fazemos daquilo que eles se propõem fazer com os meios que estão à sua disposição.

Então o que se passa com a politica externa do POTUS ? Porquê a incoerência?

De facto Trump, não se afastou de qualquer teatro de operações em que o exército dos EUA se tenha comprometido ou envolvido nos últimos 20 anos. Continuando Obama, George W. Bush e Clinton, os Estados Unidos com Trump continuam a apoiar a defesa de 60 países do mundo com acordos formais e acordos tácitos em todo o Oriente Médio e Ásia. Estão implantados em todo o mundo, com cerca de 250 mil soldados 800 bases e instalações em cerca de 70 países. O corolário de tudo isto é o aumento significativo no orçamento militar dos US para o ano de 2018!

Vejamos o caso da NATO. Trump foi extraordinariamente critico com a contribuição dos EUA para a organização do Atlântico Norte. Disse ele “23 dos 28 países membros não estão a pagar o que deveriam estar a pagar pela sua defesa". Disse e repetiu durante a campanha que as coisas tinham que mudar pois viviam a sua defesa à custa dos EUA. James Mattis, o Secretário de Defesa dos EUA, disse aos líderes europeus numa reunião da NATO em Fevereiro de 2017 que os US "mudariam o seu compromisso”, a menos que os Estados membros colocassem mais dinheiro na organização. Segundo Mattis “O contribuinte americano não pode mais ter uma parte desproporcional da defesa dos valores ocidentais. Os americanos não podem importar-se mais com a segurança de vossos filhos do que vocês. Desconsiderar a prontidão militar demonstra falta de respeito por nós mesmos, pela aliança e pelas liberdades que herdamos, que agora estão claramente ameaçadas". No entanto Trump aplaudiu e validou a entrada do Montenegro na NATO o que a primeira vista, não se percebe. Qual será o argumento para apoiar este pobre país com cerca de 600 000 pessoas, com menos de 2.000 soldados e sete helis e que se encontra há muito na esfera de influência da Rússia, quer histórica, quer socio-económica que geograficamente ? Só encontro um justificação; provocar a Rússia e Putin.

Tem Trump uma Doutrina, como Roosevelt, Nixon ou Carter ? Uma grande estratégia para o papel dos EUA no Mundo ? Não me parece.  Trump tem uma colecção de princípios - alguns operacionais, alguns filosóficos - que orientam a sua politica externa. Esses princípios são norteados por três eixos fundamentais: 1)  ter ganhos tácticos de curto prazo, em vez de estratégias de longo prazo; 2) uma visão de mundo de "soma zero", onde todos os ganhos são relativos e não há reciprocidade 3) uma visão transaccional da política externa que é desprovida de grandes considerações morais ou éticas. Isto é, uma visão típica de um business man !

Assim se explica a ênfase puramente táctica de muitas acções e a dificuldade de lhe darmos um elevado valor de coerência estratégica ou de visão alargada. Não o vemos porque de facto não existe! Como já disse, esta ênfase na táctica em detrimento da estratégia decorre da visão transaccional de Trump. A sua presidência tem sido a transposição da sua mentalidade de fazer negócios imobiliários  para a condução da política externa dos EUA. Ele prefere  ter relações externas assentes em 193 acordos bilaterais elaborados e negociados individualmente com todas as outras nações do mundo do que negociações em grupo. Para Trump todas as negociações diplomáticas, todas as acções militares, são jogos de soma zero sem conteúdo moral. Como os negócios imobiliários onde tanto sucesso alcançou.

O livre comércio mundial, a preocupação com as mudanças climáticas, a defesa da democracia e dos direitos humanos, tudo isso é relevante se os EUA beneficiarem de alguma forma e em concreto com o dinheiro que for gasto nesses assuntos. De outra forma não fazem sentido estar na agenda.

Trump não tem nenhuma "visão" de política externa coesa. Limita-se a reagir a situações por impulsos ditados pelo “gut feeling” que lhe está no ADN comercial. É capaz de se dizer e desdizer, como tantas vezes já o fez e como acima demonstrei, projectando dureza e ameaçando num dia o Irão, a Coreia do Norte ou a NATO, mas sendo apoiante da entrada do Montenegro nesta última, estando disponível para falar com o líder da Coreia do Norte ou continuando a colocar mais e mais tropas no Afeganistão. Tão depressa apoia a Rússia como ataca Putin relativamente à Ucrânia, tanto é assertivo com a politica comercial de Xi como o saúda por conseguir pressionar a Coreia do Norte, O que interessa é o resultado final. Como se chega ao objectivo é indiferente. Desde que o Daesh seja eliminado na Síria e Iraque como prometeu aos americanos ou que a Coreia do Norte seja menos assertiva, como ele o afirmou.

Qual é o maior problema? A falta de confiabilidade. De facto, muitas acções de Donald Trump criaram dúvidas quanto à confiabilidade dos EUA como nação disponível para continuar a ser um parceiro em todas as ocasiões. E quando alguém não é confiável não o ouvimos, não fazemos o que diz, nem tão pouco estamos disponíveis a perder muito tempo e energia com a pessoa. Será isto um problema grave? Não me parece. Por trás de Trump estão grandes profissionais da política externa dos EUA, capazes de corrigir na hora algum movimento em falso feito pelo POTUS como o são o Secretário de Estado, Rex Tillerson e os três generais, John Kelly (chefe de gabinete da Casa Branca), James Mattis (secretário de defesa) e McMaster (assessor de segurança nacional). Com estes está um aparelho competente e profissional de segurança nacional e diplomacia que não difere fundamentalmente das administrações anteriores de Obama e de Bush. Os erros de casting como Flynn ou Bannon já foram resolvidos.

Trump recusa o “excepcionalísmo americano” e com isto o papel de ser um farol para Mundo, um modelo. Com ele a “América está primeiro”. O resto do Mundo que tome conte de si.

Um ano depois continuamos a procurar uma linha de coerência nas suas decisões, continuamos a querer antecipar o que vai dizer ou decidir sobre determinado assunto. Temo que, por muito empenho que coloquemos na tarefa, não conseguiremos chegar a lado nenhum. Irá intervir quando menos esperámos e nada fazer quando acharmos que o deveria fazer. Get use to it.