As palavras "Pátria", "Estado" e "Nação" têm sido, nos últimos anos, usadas em defesa de diferentes grupos e das suas acções, maioritariamente com chavões para desculpar e legitimar acções e ideologias, como tal, é necessário um esclarecimento quanto ao significado destas palavras que, carregam consigo um enorme peso.
A
pátria assim será a “virtude cívica”[1],
deixando de criar uma ligação aos instintos básicos de subsistência física,
ligações estas que seriam primeiramente consigo e com os membro imediatos da
sua família, passando a pátria ser algo de mítico e por vezes espiritual. Esta evolução no psicológico humano que se pode rever já na Grécia Antiga,
quando se referiam à Cidade-estado como a Pátria, evolui no sentido de abranger
uma comunidade que se vê identificada por essa Pátria (Cícero afirma que esse
conjunto é a Plebe e a Aristocracia) e que abrange outros pertencentes a essa
pátria. Conseguindo-se assim entre os constituintes dessa pátria a boa gerência
da “coisa pública”[2].
Com
a modificação deste pensamento, a pátria é tomada então com uma herança, algo
anterior a cada homem e que ele recebe no acto do seu nascimento, como tal esta
pátria torna-se susceptível de ser defendida e mantida como foi recebido, tal
como de ser transmitida às gerações futuras, assim
sendo ela é algo intemporal, mas também é algo físico, a pátria é onde se
nasce, uma terra, a qual normalmente será tida como a terra dos país, mas a pátria de hoje em dia pode ser adoptada, sendo que nesse campo entra-se numa área de
afeição e ideia do gosto de cada um. Pode-lhe
ser atribuído o valor Paternal ou Maternal, sendo que a pátria é representativa
de todos,
Na contemporaneidade esta pátria assume um carácter mais feminino e maternal,
sendo que em épocas anteriores mais dominadas pelo homem esta assumia um carácter mais Patriarcal, tal como na antiguidade Clássica na qual o chefe e
representante da família era o “Pater
Familias”, daí a radicação da própria palavra Pátria. Esta conexão familiar
torna então, todos aqueles que se identificam com esta mesma “mãe” ou “pai” e
que a defendem, que se identifiquem com a mesma mitologia e ritos, seja tidos
como “irmãos”[3]
tornando uma comunidade como uma enorme família, gerando como já foi dito a
base para a Nação e por consequência a formação do Estado.
Esta
pátria susceptível de ser herdada e de se entregar às gerações futuras tem algo
físico que a represente sendo que, essa herança se relaciona com a terra dos
pais, essa terra serve na ideia de pátria como elemento agregador, elemento
agregador esse que levou a pátria a erguer-se do sei familiar para a chamada “patria communis”[4],
mas ao longo do tempo tem tomado um significado mais abrangente, sendo que hoje
em dia muitas vezes dentro da pátria se incluí não só a terra em que se habita,
mas também a língua que se fala e se escreve, as artes como musica, pintura e
escultura fazem parte da pátria, monumentos e mitologias, a história de um país
faz parte hoje da Pátria.
O
conjunto dos indivíduos que fazem parte da pátria constituem a Nação, sendo que
hoje me dia é complicado por vezes fazer a diferenciação entre Pátria a e
Nação, essa difícil distinção torna-se fácil de ver no chamado Patriotismo
Nacionalista que leva às revoluções liberais, que leva a extinção ou separação
com antigos regimes como foi a Revolução Americana ou a Revolução Francesa, a
exemplo disto o caso do Exército português é um dos melhores para perceber,
quando o exército carregava sobre o inimigo gritava “Por S. Miguel e Portugal” estando a pátria simbolizada em S.
Miguel, Portugal forma-se depois de uma série de batalhas com a presença da
divindade na decisão favorável destas batalhas a favor dos portugueses o que
permitiu o “nascer” da nação portuguesa, ao que esta é a herança que Portugal
recebe, a sua concepção é por vontade divina assim S. Miguel no grito de guerra
português representa a pátria, a Mitologia por de trás da Nação que é aqui
representada por Portugal, Portugal que é encabeçado pelo Rei, o Rei é o pai da
nação, tem de aplicar a justiça, manter a paz e criar condições para a
prosperidade, o Rei representa assim a população que se identifica com essa
pátria e essa mística, mas o Rei representa também a lei que é aplicada no
território da Pátria. Aludindo a um sentimento de pretensa á terra um sentido
também de pertença a uma entidade que rege o território, mais uma vez Cícero
aqui distingue estas duas entidades com que o homem se identifica, uma por
nascimento e outra por escolha “uma pátria
geográfica, e outra de direito”.[5]
Claro
que aqui também se pode falar de que o Rei seja o estado, e é certo que a Nação
pode também se definir como a instância que faz a ligação entre a pátria e o estado,
mas é claro que a definição política de estado só se firma no final do Séc. XVIII,
e inícios do Séc. XIX, neste período conturbado em que existiram várias
experiencias no âmbito da governação durante as revoluções liberais, nas quais
a aclamação ao patriotismo levou as massas a legitimar o movimento
revolucionário como vindo tendo o propósito entre outros o de salvaguardar a
nação contra um estado que a tentava deturpar, dete modo entende-se que “a pátria é o alfa fundador de todas as
filiações étnico-culturais e políticas”[6],
ao que, nestes Estado-Nação, o estado como elemento dirigente muitas vezes
tentava legitimar o seu poder como vindo da pátria e por consequente tentaria
moldar a nação ao seu tipo de estado dando-lhe veracidade. Pode-se assim ver a
nação como um movimento político já que os povos possuem uma vontade que se tenta
passar para o governo dessa nação, mas claro que pode não ser assim. Existe no
entanto na nação a ideia politica.
A
ideia de pátria e uma nação formam-se em contra posição com outra pátria e
nação, o “nós” só pode existir se
existir o “eles”, o caso português é
claro nisso, por vezes esta diferença foi apenas vista em termos de religião
como foi o movimento da “Cristianitas”
na Idade Média, que reagia contra o Islão, recorrendo a Europa à formação
Greco-Romana, em que a ideia de patria
communis extravasa também para estas ideias medievais.
É
interessante perceber os estados multinacionais, a exemplo disso no início do
Séc. XIX possui-se imensos casos desses, como o Reino da Inglaterra e da
Irlanda, o Império Otomano e o Império Austro-húngaro, que debaixo de um
Estado, existem mais que uma nação que se irão possuir as suas histórias,
mitologias e ritos. “Pelo menos até á
Revolução Francesa e, sobre tudo, a partir do século XIX, existem pátrias que
não são, não querem ser, ou não as deixam ser nações. Assim sendo, pode
defender-se que a pátria e, em particular, a pátria comum é logicamente
anterior á nação politica moderna que dela se nutre”[7].
Aqui se pode ver e em mais preciso o caso do Império Austro-húngaro, o exemplo
de um Estado que tenta moldar a nação à sua imagem, confrontos existem dentro
deste Império que irão possuir o seu clímax na primeira guerra mundial. Estes
estados-nação que tentaram criar modelos de governação totalitário radicam no
Séc. XIX com os tal estado-nação, mas existiu logo desde as revoluções liberais
quem fala-se contra a “tendência
monopolizadora do novo patriotismo cívico e nacional”[8],
como Barruel, Joseph de Maistre e De Bonald, que falavam de um «regresso às constituições históricas, pois
estas teriam respeitado a autonomia e os patriotismos das “pequenas pátrias”»[9]
Contrariando
esta ideia de “nós contra eles”
também existe uma nação que sendo constituída por pequenos estados irá, no
final do Séc. XIX ser uma única nação, debaixo de um único estado, a Itália,
que durante vários anos consegue a unificação de vários Estados, formando a
unidade politica da Itália. Mas muito antes disso em 1621 no que é hoje
Espanha, o Duque de Olivares escreve a Filipe IV que se digne a unificar todas
as suas posses e que passe a ser Rei de uma Nação.
Existe
também a ideia Europeia de civilização, que é defendida inicialmente por
Quizot, um homem moderado e liberal.
Hoje
esta ideia de uma nação europeia é apoiada por facões mais liberais de cada
nação, mas existem grupos nacionalistas, nas mais suas variadas faces
(nacionalismo liberal, o social nacionalismo, etc.) que invocando a memória da
sua pátria e munindo-se de desculpas patriotas resistem a este movimento de
aglomeração, tentando manter a sua individualidade. Tem de ser tido em conta no
entanto que “se todo o nacionalismo se
escuda num patriotismo (porque toda a nação requer uma pátria, pelo menos), nem
todo o patriotismo foi (e é) um nacionalismo”[10].
Esta
individualidade é marcada fortemente no caso da Nação portuguesa.
O
português é português como Nação, Estado e Pátria porque é diferente,
independente de outro, no caso de Portugal durante muito tempo o outro era
Castela que depois no Séc. XVII se torna Espanha. Portugal foi o primeiro
estado europeu que definiu as suas fronteiras que ainda hoje as mantém isso
ajudou a criar mais um factor de pátria e de agregação ao território. Esta ideia
de conquista do território e de progressão para além mar assentando na ideia de
que estamos sós e de que estes avanços funcionam de baixo de uma óptica
feudalista, que apenas haveria de cair nas revoluções liberais e com a Constituição
de 1822, a partir desta data só haveria em 1974 outro acontecimento que
marcaria a memória e que seria uma marca guardada pela Nação, uma revolução sem
sangue, que nos daria uma total república na qual “A ultima versão do verbete demarca a República, como regime politico,
da semântica tradicional de coisa pública ou Commonwealth. É que, se, por um
lado, ela é sinónimo de «Estado em geral, qualquer que seja a forma de governo;
o que respeita ao interesse geral dos cidadãos; v.g., Convém á República que
todos trabalhem»”[11].
O
processo na fundação do que será Portugal, assenta primeiramente na ideia de
reconquista cristã, liderada a pátria e a nação pelo estado monárquico que se
apoia no feudalismo, criando-se uma individualidade contra Leão e Castela que
se propagandearia e se lutaria na crise de 1383-85 com D. João I. Estas lutas
tanto pela reconquista cristã da Península Ibérica como a vitória de D. João I
na crise de 1383-85, pode talvez ser visto na definição de nacionalismo do Oxford English Dictionnary de 1833, que
define nacionalismo como a “doutrina
segundo a qual certas nações são o objecto da preferência divina”[12]
Esta
individualização e luta por uma Nação e Pátria independente gerou outra lenda
constituinte da pátria portuguesa, que será característica do messianismo que na nossa nação se afirma
na figura de D. Sebastião, o rei que foi e que se espera que volte, mas que se
sabe que não volta, a memória que se fez parte integrante da pátria e que a
nação faz questão de guardar para se afirmar como diferente.
Quando
se geram os conflitos liberalistas[13]
em Portugal que irão culminar na guerra civil, irá haver um “confronto entre o internacionalismo e o
nacionalismo, tão visível no iluminismo e na reação aos iluministas, nos
aderentes á Revolução Francesa e nos contrários, nas duas facções da guerra
civil, no internacionalismo socialista e da reacção à sua implantação”[14],
aqui se tenta por parte de D. Pedro IV de criar um Portugal europeu, D. Pedro
que se torna nos Messias do mundo contemporâneo, sendo que desde as Revoluções
Liberalistas os Messias têm tomado a pele de dirigentes políticos e estadistas,
sendo que a sua ideia de redenção se torna no mundo contemporâneo “essencialmente económica”, para mais
desde esta altura o Estado tem criado a ideia de neutralidade da Nação
portuguesa é levada a cabo devido a essa mesma ideologia económica messiânica,
esta ideologia decorre das nossas vulnerabilidades e da crónica dependência de
outras potências que foi crescendo especialmente durante as guerras
Napoleónicas, “Porém esta dependência
para a neutralidade choca-se com a nossa própria fraqueza, porque não tendo
força suficiente para suficiente para sermos neutrais, acabamos por optar, ou
seja, por deixar de o ser”[15],
a exemplo disso temos a Segunda Guerra Mundial.
A
Individualidade da Nação e Estado português pode muito bem ser exemplificado
num poema de Fernando Pessoa chamado de nevoeiro:
“Nem rei nem lei, nem
paz nem guerra, / Define com perfil e ser / Este fulgor baço da terra / Que é
Portugal a entristecer / Brilho sem luz e sem arder, - Como o que o fogo -
fátuo encerra. / Ninguém sabe que coisa quer, / Ninguém conhece que alma tem, /
Nem o que é mal nem o que é bem. / (Que ânsia distante perto chora?) / Tudo é
incerto e derradeiro. / Tudo é disperso, nada é inteiro. / Ó Portugal, hoje és
nevoeiro... / É a hora!”[16]
O
Estado é, por encargo dos seus poderes o órgão governador de uma sociedade
politicamente organizada, ou mais precisamente, é uma colectividade fixa num
território, na qual existe uma diferenciação entre governantes e governados e
uma autoridade soberana. O elemento essencial e específico de todo o estado é
pois, o poder soberano, poder este de formular leis e fazer cumprir as mesmas.
“O Fim do Estado é realizar o bem comum dos
cidadãos e é para atingir esse fim que o Estado faz as leis e formula o Direito”[17]
No
que toca ao conceito de Nacionalismo é referido em 1945 na reedição do Morais como “preferência, por vezes exclusiva, por tudo o que diz respeito à nação
de que se depende”[18],
ou seja, é a defesa dos interesses da nação.
A
ideia de que o Estado é uma forma de autonomia estará demonstrada desde 1890,
momento em que se consolida a ideia de Estado-Nação em Portugal, Fernando
Catroga afirma que em 1890 a ideia de Estado Nação seria a de um “conjunto dos cidadãos, e também o território
ou circunscrição política que constitui um Estado independente, regido por leis
próprias com um governo absolutamente autónomo”[19]
Assim, sendo o Estado a entidade
regulamentadora da individualização de um povo, e o responsável pela sua
conduta e seu guardião, o Estado é um resultado da própria nação, sendo que a
cada Estado corresponde uma Nação, claro que isto não se verifica em todos os
casos, a vertente imperialista que foi combatida em todo o Séc. XX em África e
na Ásia demonstra isso, mas essas mesmas novas nações que nascem do jugo
imperial, fará-lo-ião segundo Catroga, protegidas pelo “princípio wilsoniano segundo o qual a cada nação deve caber um Estado,
e irromperá dos escombros dos impérios multiculturais”[20].
Hoje
em dia os vários países, sobre tudo os europeus não se podem afirmar estanques,
e com tal as pessoas que circulam de outros países para a Europa e que aí se
fixam criam uma resistência á uniformização de consciências.
[1] CATROGA, Fernando; PÁTRIA,
NAÇÃO, NACIONALISMO; P.13.
[3] CATROGA, Fernando; O Afecto das Palavras in Ensaio
Respublicano; FFMS; p. 12.
[4] CATROGA, Fernando; PÁTRIA,
NAÇÃO, NACIONALISMO; P.12.
[6] CATROGA, Fernando; PÁTRIA,
NAÇÃO, NACIONALISMO; P.27.
[7] CATROGA, Fernando; O Afecto das Palavras in Ensaio
Respublicano; FFMS; p. 21.
[8] CATROGA, Fernando; PÁTRIA,
NAÇÃO, NACIONALISMO; P.33.
[9] CATROGA, Fernando; PÁTRIA,
NAÇÃO, NACIONALISMO; P.33.
[11] CATROGA, Fernando; O Nacionalismo in Ensaio Respublicano;
FFMS; p. 21.
[12] CATROGA, Fernando; PÁTRIA,
NAÇÃO, NACIONALISMO; P.41
[13] Quanto a utilização de
expressões patrióticas Fernando Catroga afirma que: “… a proliferação de expressões de cunho patriótico, que tiveram uma
grande utilização durante as invasões francesas e, depois, no decorrer da
revolução liberal de 1820-1822, recebia guarida no dicionário.” P.45.
[14] BARRETO, António; Portugal in Da Estratégia; Tribuna da
História; Lisboa; 2010; p.323.
[15] BARRETO, António; Portugal in Da Estratégia; Tribuna
da História; Lisboa; 2010; p.334.
[16] http://portugues-fcr.blogspot.pt/2011/03/nevoeiro-fernando-pessoa.html - Consultado em 17/11/2015.
[17] AFONSO, A. Martins; Princípios
fundamentais de Organização política e administrativa da Nação; Papelaria
Fernandes; Lisboa; p. 13.
[18] P.47
[19]CATROGA, Fernando; PÁTRIA, NAÇÃO,
NACIONALISMO; P.47
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